Aparece inesperada uma onda de pelo menos dois metros à minha frente. Eu quase a chegar lá fora! Penso que por esta não irei conseguir passar, que ela irá colapsar com toda a força mesmo diante de mim!
Não sei por que mecanismos mentais, mas associo de imediato o momento presente à nossa conversa de ontem… e rio… deixo-me rir perante a inevitabilidade da coisa.
“- Calha a todos, meu caro!” – Disseste de forma irónica e na toada bem-disposta que tentava dissimular toda a carga emotiva que ia no teu coração… nos nossos corações!
Remo tentando ganhar velocidade, mesmo sabendo que vou apanhar com ela na cabeça.
Poderia ser o corolário deste nosso último encontro. Não havia muito mais a dizer, as palavras que poderiam ser trocadas já delas tínhamos pleno conhecimento. Mas inventámos a razão para haverem uns últimos instantes… perto um do outro.
Tento ser tecnicamente perfeito no duck-dive, irrepreensível nos gestos e no timing que me possibilite passar incólume por esta imensa massa de água que se ergue e dobra à minha frente.
Sei que foram relativamente poucos, esses momentos em que estivemos juntos… mas todos tão preciosos!
Chove lá fora e nós despedimos-nos no carro com um abraço, o amor traduzido num aperto forte, talvez o último a que nos entregamos… Rolam-me inevitáveis as lágrimas na cara.
“- É chuva.” – Digo… e despeço-me!
Sou tomado pela força da onda… de nada me serviu a técnica, de nada me serviu o rigor dos gestos, é-me arrancada a prancha das mãos e sou arrastado ao acaso naquele turbilhão branco…
“- Calha a todos, meu caro! Calha a todos!”