sexta-feira, 31 de outubro de 2008

An End Has a Start



Aparece inesperada uma onda de pelo menos dois metros à minha frente. Eu quase a chegar lá fora! Penso que por esta não irei conseguir passar, que ela irá colapsar com toda a força mesmo diante de mim!

Não sei por que mecanismos mentais, mas associo de imediato o momento presente à nossa conversa de ontem… e rio… deixo-me rir perante a inevitabilidade da coisa.

- Calha a todos, meu caro!” – Disseste de forma irónica e na toada bem-disposta que tentava dissimular toda a carga emotiva que ia no teu coração… nos nossos corações!

Remo tentando ganhar velocidade, mesmo sabendo que vou apanhar com ela na cabeça.

Poderia ser o corolário deste nosso último encontro. Não havia muito mais a dizer, as palavras que poderiam ser trocadas já delas tínhamos pleno conhecimento. Mas inventámos a razão para haverem uns últimos instantes… perto um do outro.

Tento ser tecnicamente perfeito no duck-dive, irrepreensível nos gestos e no timing que me possibilite passar incólume por esta imensa massa de água que se ergue e dobra à minha frente.

Sei que foram relativamente poucos, esses momentos em que estivemos juntos… mas todos tão preciosos!
Chove lá fora e nós despedimos-nos no carro com um abraço, o amor traduzido num aperto forte, talvez o último a que nos entregamos… Rolam-me inevitáveis as lágrimas na cara.
- É chuva.” – Digo… e despeço-me!

Sou tomado pela força da onda… de nada me serviu a técnica, de nada me serviu o rigor dos gestos, é-me arrancada a prancha das mãos e sou arrastado ao acaso naquele turbilhão branco…

- Calha a todos, meu caro! Calha a todos!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira


Roberto Saviano, escritor italiano de 29 anos.

Escreveu o livro Gomorra, em que se baseia o argumento do filme homónimo sobre a Camorra, a Máfia Napolitana, que agora ameaça matá-lo. 3ª feira, ao ouvir os Sinais de Fernando Alves na TSF, encontrei nele a base para escrever sobre localismo.

Há muito, de vários tipos e alguns até mesmo defensáveis, mas para mim, que até não desgosto da simples contemplação enquanto aguardo a minha volta no carrossel, estão para o surf como a Apêndice o para o corpo humano. Aos locais e ocasionais visitantes de qualquer spot, a solução resume-se numa palavra: Respeito (pouco original, eu sei, de forma que opino também sobre uma outra discussão secante a esta - com o sentido matemático de intersecção, mas aproveitando também esse outro em que estavam a pensar - que li por aí, sublinhando que é independente do veículo utilizado).

Das vezes que convivi com exibições do mesmo, a demonstração de poder não passou de voltinhas ao pico ou um ou outro dropino, mas a inibição da liberdade já está lá. Nas suas piores formas o localismo tem laivos de crime organizado. É aí que entra a comparação.

Cumprindo-se regras de respeito mútuo e partilha por um bem comum, queria deixar a minha posição. Sobre lados tão claramente opostos e valendo a mesma aquilo que valha, dentro como fora de água, Io sono Saviano.

São regras como essas que nos tornam humanos. E isso até um cego consegue ver...



terça-feira, 21 de outubro de 2008

Cardboard Surfboards

A necessidade faz o engenho, já dizia a minha avó!

E Mike Sheldrake é daqueles engenhosos que a braços com a sua Robert August 8'6", levada literalmente à fadiga por 13 longos anos de surfadas e pela falta de dinheiro para a substituir, teve de procurar os seus próprios meios para fazer uma nova prancha.


Não quis optar pelo foam e pensando primeiramente em fazer uma prancha oca de madeira começou por tentar utilizar os seus conhecimentos informáticos e de matemática para idealizar uma em 3D. Por acaso nem se deu ao trabalho de procurar um software para o efeito, achou que seria bem mais divertido perceber por ele próprio porque superfícies, curvas e linhas se cose uma prancha de surf.





O resultado e output da brincadeira resultou num conjunto de peças de cartão e num novo método de as montar (no mesmo ponto apenas se cruzam duas peças simultaneamente, ao contrários de outros métodos usados na montagem do esqueleto de algumas pranchas de madeira), por seu turno, a rede gerada nesta montagem resulta igualmente numa agradável arquitectura de formas.


Depois já só lhe faltou inventar uma forma de cortar e numerar as milhentas peças, montá-las, e ao que parece esta fase torna-se muito mais rápida à noite com um cházinho do que numa tarde quente com umas quantas cervejas, e fibrá-la... parece simples, não é? Bem, de facto a fibragem deu uns quantos problemas e requereu umas quantas tentativas até resultar na perfeição das suas já inúmeras pranchas translúcidas de que se compõe o seu quiver.


Ainda bem que o Mike não estava muito endinheirado na altura!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A pedido das nossas famílias...

... seguem algumas das fotos da nossa 'voltinha' a Marrocos:


Vans - versão marroquina.


Moçoilas...


... à espera para as ver passar?


Homem e seu comparsa animal.


Locais...


... e suas respectivas mulheres!


Cães, gatos, cachorros e gatinhos... uma praga de inocentes criaturas!


No barco, momento pré-conquista do continente africano - Parte I.


Parte II


O nosso quintal em Taghazout.

Fotos do próprio.

domingo, 12 de outubro de 2008

Te Aime, Anne!


"[...] O pescador
Tem dois amor
Um bem na Terra,
Um bem no Mar [...]"

Dorival Caymmi, O Bem do Mar









Até já, meus bens.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

"Mundaka" - The Movie



Não dá para colocar aqui os extractos do filme, mas ficam abaixo os links e a sugestão para os irem ver.

Enquanto estive em Mundaka fiz várias vezes contas de cabeça de como seria bom poder-me para lá mudar. Parece quase uma cidade idealizada, com o seu casario, a sua beleza natural, o ambiente e a onda perfeita a correr ao seu lado. Pessoalmente apenas lhe encontro três defeitos, a distância a que vivo dela, o tempo quase sempre sombrio e a comida.

Mas a comida, salvo raras excepções, talvez seja um mal comum a toda a Espanha e neste caso quase que se pode transformar em algo de positivo... Eu explico, mesmo correndo o risco de me virem a roubar a ideia, é que, a concretizar a emigração acho que bastava abrir uma simples loja de sopas e comida caseira para ser bem sucedido.

Seguem os trechos do filme:

Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4

Tenho quase a certeza que a senhora mais velhota que aparece neles a falar é a mesma para a qual o Maya me chamou a atenção, estava sentada num banco de jardim que dava para o pico e comentava sozinha empolgada as melhores ondas que via, por vezes dando pequenos pulinhos em resposta aos melhores tubos e ondas surfadas.

Também nos cruzámos com o Mike, o americano dono do Hotel Mundaka e que aparece no final de uma das partes, lembro-me de estarmos na água e de o ouvir contar que foram necessários muitos anos a viver lá até o considerarem também um dos locais. Pode ser que, conquistando-os pelo estômago, leve menos tempo!

terça-feira, 7 de outubro de 2008

As-Salaam-Alaikum


Fotografia de Farid A. Abdi akaReedfa

Quando andava ali entre os últimos anos da Secundária e os primeiros da Faculdade havia uma facilidade notável em nos atirarmos de cabeça para qualquer desafio lançado. Se as ideias fossem suficientemente apetecíveis, pouco importava a extravagância ou as consequências que elas teriam, nós tentávamos realizá-las.

Depois, com o natural tomar de responsabilidades que a vida impõe, grande parte dessa espontaneidade deixa de ter espaço para existir, pelo menos de forma tão solta.

Agora já meço consequências, mas continuo a achar que as boas ideias são para realizar, mesmo que servidas com uma boa dose de bizarria e extravagância.

No mês passado, já não sei porquê, telefonei ao Luís e ele já tinha decidido:

- "Vou a Marrocos em Outubro, queres vir?"

- "E como é que estás a pensar ir, para que sítios, em que datas?... Essas coisas."

- "É pá, não sei, mas depois de acabar os exames vou. Ainda não sei como e as datas é a combinar, a ideia é ir para lá e surfar."

A coisa pareceu-me bem pensada!

Mas eu tinha acabado de vir de férias, estava quase falido, o meu puto T tinha acabado de entrar para a pré e iniciávamos novas rotinas, teria de deixar todo o meu trabalho novamente a braços com o meu colega e todas as responsabilidades familiares com a minha Ana.

Vá se lá saber porquê a ideia não me saiu da cabeça, fiz o que tinha a fazer, impingi-a também à do Pinto.

Ele por mil e uma razões também não poderia ir. Mas sempre que falávamos, falávamos de Marrocos.

E, entretanto, veio-me o dinheiro do IRS, o meu puto T entrou para a pré de forma serena e tranquila, o meu colega continua a ser o melhor sócio que se pode ter e a minha Ana a mais compreensiva e querida das mulheres - deixou-me ir! (Ana hedbuki)

O Pinto, também ele acometido pela maior das vontades em concretizar a viagem, lançou finalmente um desesperado, mas valente e viril: "RADI NKUL TAJINE", que mais tarde percebeu ser apenas um "Amanhã comerei Tajine", mas aquilo fez lá eco em casa e atingiu a sensibilidade da sua mais-que-tudo, tanto que, sendo ela a segunda mais compreensiva e querida das mulheres (aqui o Pinto até pode discordar que eu deixo) fez-lhe um cuscuz e também o deixou seguir caminho.

Como o Luís é um gajo descontraído o suficiente para deixar a organização da coisa para o dia anterior à partida, nós decidimos a data da viagem por ele e assim, ao menos, ele saberá quando é a véspera. Partimos no próximo Domingo e também já sabemos que será para a zona de Agadir que é onde partem as melhores ondas.

À comitiva junta-se também o experiente e intrépido viajante, Rudolfo Valente, que lá nos incutiu algum juízo e nos fez marcar com antecedêcia o local da estadia ("com antecedência", leia-se, 5 dias antes de partirmos).

A história da nossa partida está praticamente toda contada e, pelo sim pelo não, também memorizada, porque caso sejamos vítimas de algum saque de proporções marroquinas, sempre há em Marraquexe uma praça onde pagam bem aos contadores de histórias!

As-Salaam-Alaikum