terça-feira, 30 de dezembro de 2008

7 mares

Wade Koniakowsky - dreams of waves

"Ao escrever estas linhas, ergo os olhos e o meu olhar abarca a vastidão marinha. Estou na praia de Waikiki, na ilha de Oahu. Lá longe, no céu azul, as nuvens sopradas pelos alísios deslocam-se lentamente por cima do azul-turquesa das ondas. Não tão longe, o mar é esmeralda e de um verde de azeitona claro. Em volta dos recifes, a água toma uma tonalidade púrpura ardósia manchada de vermelho. Mais perto de mim, bandas verdes mais fortes alternam com bandas castanhas, assinalando a presença de línguas de areia entrecortadas por bancos de coral vivo. Uma ressaca magnífica ressoa e retumba por cima e em volta destas cores fantásticas. Como disse, ergo os olhos para contemplar tudo isto e, na crista branca de uma onda, surge de repente uma forma negra, muito direita, um homem-peixe ou deus marinho, deslizando por sobre a curva da vaga que se vai desfazendo e espraiando na sua corrida para a margem. Envolto até à cintura pelas poalha dos salpicos, o corpo do homem é levado no dorso do mar e lançado para terra, percorrendo num só movimento um quarto de milha. É um canaca numa prancha de surf. E logo ali decido que, quando terminar este capítulo, também vou deslizar sobre esta orgia de cores, tentando cavalgar aquelas ondas como ele, embora sem a mesma perícia, mas vivendo plenamente estes curtos instantes da vida. A imagem deste mar colorido e do deus marinho, o canaca voador, acrescentam-se às razões pelas quais um jovem deve viajar para oeste, internar-se cada vez mais nessa direcção, para lá do Sol, e finalmente completar o caminho de regresso a casa."

Estas foram algumas das impressões publicadas no livro "O Cruzeiro do Snark", que Jack London recolheu em 1907 e que passado pouco mais de um século me foram oferecidas como prenda de Natal pela minha mulher.

Pensando agora na razão da oferta, suponho que não devo cair em erro, se considerar que a sua escolha foi a resposta ao pressentimento, mesmo que inconsciente, de que eu me iria sentir identificado pela escrita de um outro homem vadio. E de facto, as descrições vigorosas que Jack London faz do mundo que encontrou ao longo da sua viagem oceânica, bem como o relato das suas imensas aventuras, apelam de uma forma muito directa ao meu instinto de liberdade. Ao meu e à da maioria da gente, suponho eu, pois só possuindo uma natureza muito insípida e fria se pode passar incólume pelos seus episódios nos mares do Sul e suas ilhas tropicais sem ficar de desejo ateado, a ambicionar partir em viagem, a sonhar com paisagens marítimas abertas e infinitas, ou, no meu caso, com encontros fortuitos com ondas perfeitas e solitárias

E veio-me agora a ideia, a este respeito, de que poderia ser um sucesso para a editora lançar o livro num kit com âncora. A intenção, ao contrário do que possa estar a dar a entender, não seria a de vender o barco às peças distribuído num sem número de fascículos até o termos completo e pronto a zarpar. A âncora seria antes a garantia de, oferecido o livro à pessoa amada, não lhe recear uma eventual, impulsiva e súbita fuga para um dos 7 mares.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

La Graine et le Mulet


Ingredientes:

3 peixes
1 tuperware;
1 solid-top guitar;
4 engenheiros civis;
1 VW “pão alentejano”;
1 cx. de barras de chocolate Herbalife;
1 souk;
1 chá de menta (servido em copos de 3);
8 dias de conversa;
Azeite, pimenta, salero e propines q.b.


Modo de Preparação:

Pegar nos engenheiros e colocá-los em água com ondas, a demolhar;

Passado algum tempo surgirá a vontade de um "projecto". Deve-se agarrar com unhas e dentes, descascar de todos os contras e reservar a saudade. Amanhar os peixes, com todo o cuidado, e guardá-los no tuperware. Escoar a água dos engenheiros, marcar horas e juntar tudo no pão alentejano;

Ligar o forno a 1.500km ao longo de três países, dois continentes e um mundo de intervalo. Regar com a saudade a passagem das fronteiras e ir controlando a cozedura. Caso seja necessário, adicionar propines, já que ajudam a chegada de novas imagens e cheiros. Há medida que voltem a surgir fios de saudade, deixá-los correr, para apurar o molho, e estender com a ajuda das barras de chocolate por um dia inteiro;

Retirar do forno e levar de novo o recheio à água: deixar o cansaço expulsar o cansaço e as conversas, sobre tudo e nada, a ecoar entre o Jack e a guitarra. Temperar a gosto mas recomenda-se duas pitadas de salero, três de pimenta e dois fios e meio de azeite Galo. Repetir tantas vezes quanto a saudade o permita. Não esquecer de envolver os engenheiros no souk para ganharem um toque “africano”.

Finalmente, recolocar no pão e levar novamente ao forno. Desfazer a distância até se evaporar o molho. Guardar as lembranças e servir num único prato. Comer à mão, acompanhando com o chá de menta preparado no bule, de preferência daqueles antigos, antigos, antigos...

E bom apetite.


Observações:

Este não tem grandes segredos e é, provavelmente, o melhor cuscuz do mundo.


Fotografia de Kátia Felício, Grãos de Areia

terça-feira, 18 de novembro de 2008

Como 'uma pequena morte'




Fotografias devidamente surrupiadas à Tatiana e ao Nico.


São momentos oportunos e reconfortantes estes, em que, como que dando-nos uma pausa, saímos para fora de nós próprios.

Ver por fora, estando dentro! Por vezes apenas pelo instante em que se nos suspende a respiração e o batimento cardíaco nos tende para zero.

A fotografia, num seu estado maior, consegue muitas vezes traçar um roteiro por essas pequenas mortes instantâneas que sofremos. Dar a mão, e levar outros a visitar os nossas momentos de meditação.


"Não foi bem uma vista aérea, foi uma coisa estranha, como se estivesse em cima...

Uma espécie de aldeia em miniatura, que eu percorria por dentro estando fora...

É como se olhasse para as minhas botas e as visse dentro dos meus pés, apesar de calçadas...

Era como se eu fosse maior do que o que sou - como se estivesse todo dentro de algo mais pequeno do que eu - dentro e fora em simultâneo, porque ao mesmo tempo que cabia lá dentro era maior do que aquilo em que cabia - uma espécie de ilusão física - de anulação do volume - ou de inibição do impossível - uma abstracção indizível..."

da letra da música "Humano" - Mão Morta

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Superior


Sabes que não te vamos esquecer?

Alinhaste-te por milhares de milhas náuticas para assim te ofereceres, imaculada.

Uma tela em branco.

E em ti desenhámos aquilo que conseguimos.

Linhas do nosso passado, retratos do nosso presente e esboços do nosso futuro.

Sei que te vou encontrar várias vezes e acredita que te reconhecerei.

És as esquerda perfeita que aparece quando eu mais preciso e decidi hoje que vais ser parte da minha vida. Vou desenhar em ti uma mulher, bonita.

E vou-te sentir falta como se sente de um grande amor.

Mas quando apareceres e me acenares, aí vou deixar em ti aquilo que não deixo nas outras.

A saudade.

"Morrendo os dois de saudade, temos toda a eternidade, para pôr à saudade fim." - Manuela de Freitas/José António Sabrosa

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Fight-Club



Encontramos-nos frente-a-frente, cara-a-cara, eu, imóvel, fito-o nos olhos da forma mais serena possível. A minha única intenção: acertar-lhe em cheio com o punho que previamente cerrei com a máxima tensão.

Convém não falhar o primeiro gesto, ele ganha-me em compleição física, tem pelo menos mais 20kg que eu. Entretanto ele lembra-se de me começar a ofender e eu não preciso de mais, acerto-lhe em cheio no nariz, mesmo em desequilíbrio levo logo o troco, acerta-me de lado na cara! A adrenalina é tanta que não sinto qualquer dor, atiro-me para cima dele e vamos para o chão em pleno frenesim de pancadaria.

O César já há algum tempo que nos tenta separar e só agora consegue, mete-se no meio e impõe a pausa. Eu digo-lhe ofegante:

-Vamos César, vamos surfar!

E vamos mesmo, vestimos os fatos num minuto, pegamos nas pranchas e saímos de casa, deixando-o para trás de dentes cerrados e nariz a sangrar.

Também eu ainda tremo de raiva, dói-me a cabeça e penso que talvez vá ficar de olho inchado, no entanto sinto-me aliviado, subconscientemente já há muito que lhe desejava ter mandado um par de murros, apenas nunca pensei vir a concretizá-los. Sinto-me um tanto ou quanto animal, desde o meu 5º ano, e já não me lembro eu porquê, que não andava à porrada.

O César, com a brincadeira, acabou por andar aos tombos contra as paredes e tem o braço todo esfacelado, arde-lhe com o sal, a mim, a água fria atenua-me a dor e ainda cheio de adrenalina surfo de forma animalesca!

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

An End Has a Start



Aparece inesperada uma onda de pelo menos dois metros à minha frente. Eu quase a chegar lá fora! Penso que por esta não irei conseguir passar, que ela irá colapsar com toda a força mesmo diante de mim!

Não sei por que mecanismos mentais, mas associo de imediato o momento presente à nossa conversa de ontem… e rio… deixo-me rir perante a inevitabilidade da coisa.

- Calha a todos, meu caro!” – Disseste de forma irónica e na toada bem-disposta que tentava dissimular toda a carga emotiva que ia no teu coração… nos nossos corações!

Remo tentando ganhar velocidade, mesmo sabendo que vou apanhar com ela na cabeça.

Poderia ser o corolário deste nosso último encontro. Não havia muito mais a dizer, as palavras que poderiam ser trocadas já delas tínhamos pleno conhecimento. Mas inventámos a razão para haverem uns últimos instantes… perto um do outro.

Tento ser tecnicamente perfeito no duck-dive, irrepreensível nos gestos e no timing que me possibilite passar incólume por esta imensa massa de água que se ergue e dobra à minha frente.

Sei que foram relativamente poucos, esses momentos em que estivemos juntos… mas todos tão preciosos!
Chove lá fora e nós despedimos-nos no carro com um abraço, o amor traduzido num aperto forte, talvez o último a que nos entregamos… Rolam-me inevitáveis as lágrimas na cara.
- É chuva.” – Digo… e despeço-me!

Sou tomado pela força da onda… de nada me serviu a técnica, de nada me serviu o rigor dos gestos, é-me arrancada a prancha das mãos e sou arrastado ao acaso naquele turbilhão branco…

- Calha a todos, meu caro! Calha a todos!

sexta-feira, 24 de outubro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira


Roberto Saviano, escritor italiano de 29 anos.

Escreveu o livro Gomorra, em que se baseia o argumento do filme homónimo sobre a Camorra, a Máfia Napolitana, que agora ameaça matá-lo. 3ª feira, ao ouvir os Sinais de Fernando Alves na TSF, encontrei nele a base para escrever sobre localismo.

Há muito, de vários tipos e alguns até mesmo defensáveis, mas para mim, que até não desgosto da simples contemplação enquanto aguardo a minha volta no carrossel, estão para o surf como a Apêndice o para o corpo humano. Aos locais e ocasionais visitantes de qualquer spot, a solução resume-se numa palavra: Respeito (pouco original, eu sei, de forma que opino também sobre uma outra discussão secante a esta - com o sentido matemático de intersecção, mas aproveitando também esse outro em que estavam a pensar - que li por aí, sublinhando que é independente do veículo utilizado).

Das vezes que convivi com exibições do mesmo, a demonstração de poder não passou de voltinhas ao pico ou um ou outro dropino, mas a inibição da liberdade já está lá. Nas suas piores formas o localismo tem laivos de crime organizado. É aí que entra a comparação.

Cumprindo-se regras de respeito mútuo e partilha por um bem comum, queria deixar a minha posição. Sobre lados tão claramente opostos e valendo a mesma aquilo que valha, dentro como fora de água, Io sono Saviano.

São regras como essas que nos tornam humanos. E isso até um cego consegue ver...



terça-feira, 21 de outubro de 2008

Cardboard Surfboards

A necessidade faz o engenho, já dizia a minha avó!

E Mike Sheldrake é daqueles engenhosos que a braços com a sua Robert August 8'6", levada literalmente à fadiga por 13 longos anos de surfadas e pela falta de dinheiro para a substituir, teve de procurar os seus próprios meios para fazer uma nova prancha.


Não quis optar pelo foam e pensando primeiramente em fazer uma prancha oca de madeira começou por tentar utilizar os seus conhecimentos informáticos e de matemática para idealizar uma em 3D. Por acaso nem se deu ao trabalho de procurar um software para o efeito, achou que seria bem mais divertido perceber por ele próprio porque superfícies, curvas e linhas se cose uma prancha de surf.





O resultado e output da brincadeira resultou num conjunto de peças de cartão e num novo método de as montar (no mesmo ponto apenas se cruzam duas peças simultaneamente, ao contrários de outros métodos usados na montagem do esqueleto de algumas pranchas de madeira), por seu turno, a rede gerada nesta montagem resulta igualmente numa agradável arquitectura de formas.


Depois já só lhe faltou inventar uma forma de cortar e numerar as milhentas peças, montá-las, e ao que parece esta fase torna-se muito mais rápida à noite com um cházinho do que numa tarde quente com umas quantas cervejas, e fibrá-la... parece simples, não é? Bem, de facto a fibragem deu uns quantos problemas e requereu umas quantas tentativas até resultar na perfeição das suas já inúmeras pranchas translúcidas de que se compõe o seu quiver.


Ainda bem que o Mike não estava muito endinheirado na altura!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

A pedido das nossas famílias...

... seguem algumas das fotos da nossa 'voltinha' a Marrocos:


Vans - versão marroquina.


Moçoilas...


... à espera para as ver passar?


Homem e seu comparsa animal.


Locais...


... e suas respectivas mulheres!


Cães, gatos, cachorros e gatinhos... uma praga de inocentes criaturas!


No barco, momento pré-conquista do continente africano - Parte I.


Parte II


O nosso quintal em Taghazout.

Fotos do próprio.

domingo, 12 de outubro de 2008

Te Aime, Anne!


"[...] O pescador
Tem dois amor
Um bem na Terra,
Um bem no Mar [...]"

Dorival Caymmi, O Bem do Mar









Até já, meus bens.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

"Mundaka" - The Movie



Não dá para colocar aqui os extractos do filme, mas ficam abaixo os links e a sugestão para os irem ver.

Enquanto estive em Mundaka fiz várias vezes contas de cabeça de como seria bom poder-me para lá mudar. Parece quase uma cidade idealizada, com o seu casario, a sua beleza natural, o ambiente e a onda perfeita a correr ao seu lado. Pessoalmente apenas lhe encontro três defeitos, a distância a que vivo dela, o tempo quase sempre sombrio e a comida.

Mas a comida, salvo raras excepções, talvez seja um mal comum a toda a Espanha e neste caso quase que se pode transformar em algo de positivo... Eu explico, mesmo correndo o risco de me virem a roubar a ideia, é que, a concretizar a emigração acho que bastava abrir uma simples loja de sopas e comida caseira para ser bem sucedido.

Seguem os trechos do filme:

Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4

Tenho quase a certeza que a senhora mais velhota que aparece neles a falar é a mesma para a qual o Maya me chamou a atenção, estava sentada num banco de jardim que dava para o pico e comentava sozinha empolgada as melhores ondas que via, por vezes dando pequenos pulinhos em resposta aos melhores tubos e ondas surfadas.

Também nos cruzámos com o Mike, o americano dono do Hotel Mundaka e que aparece no final de uma das partes, lembro-me de estarmos na água e de o ouvir contar que foram necessários muitos anos a viver lá até o considerarem também um dos locais. Pode ser que, conquistando-os pelo estômago, leve menos tempo!

terça-feira, 7 de outubro de 2008

As-Salaam-Alaikum


Fotografia de Farid A. Abdi akaReedfa

Quando andava ali entre os últimos anos da Secundária e os primeiros da Faculdade havia uma facilidade notável em nos atirarmos de cabeça para qualquer desafio lançado. Se as ideias fossem suficientemente apetecíveis, pouco importava a extravagância ou as consequências que elas teriam, nós tentávamos realizá-las.

Depois, com o natural tomar de responsabilidades que a vida impõe, grande parte dessa espontaneidade deixa de ter espaço para existir, pelo menos de forma tão solta.

Agora já meço consequências, mas continuo a achar que as boas ideias são para realizar, mesmo que servidas com uma boa dose de bizarria e extravagância.

No mês passado, já não sei porquê, telefonei ao Luís e ele já tinha decidido:

- "Vou a Marrocos em Outubro, queres vir?"

- "E como é que estás a pensar ir, para que sítios, em que datas?... Essas coisas."

- "É pá, não sei, mas depois de acabar os exames vou. Ainda não sei como e as datas é a combinar, a ideia é ir para lá e surfar."

A coisa pareceu-me bem pensada!

Mas eu tinha acabado de vir de férias, estava quase falido, o meu puto T tinha acabado de entrar para a pré e iniciávamos novas rotinas, teria de deixar todo o meu trabalho novamente a braços com o meu colega e todas as responsabilidades familiares com a minha Ana.

Vá se lá saber porquê a ideia não me saiu da cabeça, fiz o que tinha a fazer, impingi-a também à do Pinto.

Ele por mil e uma razões também não poderia ir. Mas sempre que falávamos, falávamos de Marrocos.

E, entretanto, veio-me o dinheiro do IRS, o meu puto T entrou para a pré de forma serena e tranquila, o meu colega continua a ser o melhor sócio que se pode ter e a minha Ana a mais compreensiva e querida das mulheres - deixou-me ir! (Ana hedbuki)

O Pinto, também ele acometido pela maior das vontades em concretizar a viagem, lançou finalmente um desesperado, mas valente e viril: "RADI NKUL TAJINE", que mais tarde percebeu ser apenas um "Amanhã comerei Tajine", mas aquilo fez lá eco em casa e atingiu a sensibilidade da sua mais-que-tudo, tanto que, sendo ela a segunda mais compreensiva e querida das mulheres (aqui o Pinto até pode discordar que eu deixo) fez-lhe um cuscuz e também o deixou seguir caminho.

Como o Luís é um gajo descontraído o suficiente para deixar a organização da coisa para o dia anterior à partida, nós decidimos a data da viagem por ele e assim, ao menos, ele saberá quando é a véspera. Partimos no próximo Domingo e também já sabemos que será para a zona de Agadir que é onde partem as melhores ondas.

À comitiva junta-se também o experiente e intrépido viajante, Rudolfo Valente, que lá nos incutiu algum juízo e nos fez marcar com antecedêcia o local da estadia ("com antecedência", leia-se, 5 dias antes de partirmos).

A história da nossa partida está praticamente toda contada e, pelo sim pelo não, também memorizada, porque caso sejamos vítimas de algum saque de proporções marroquinas, sempre há em Marraquexe uma praça onde pagam bem aos contadores de histórias!

As-Salaam-Alaikum

sábado, 27 de setembro de 2008

Stay Hungry, Stay Foolish



Quantas vezes não me deparo eu com realidades tão bizarras, que à primeira vista me parecem completamente despropositadas? Arriscava responder que talvez tantas como aquelas em que fico interessado numa leitura menos superficial dessas mesmas descobertas, por vezes, para constatar que por detrás de uma fachada menos convencional se encerram ideias e conteúdos bastante profundos.



Ri-me quando tropecei no trabalho do Atelier Yanagi, foi num vídeo referente à tentativa de surfarem na prancha que tinham acabado de fazer a partir de garrafas de água de plástico (PET). Mas para além de caricata, a ideia da reutilização de todo aquele lixo pareceu-me simpática, de tal forma que resolvi perseguir o Mr. Yanagisawa, líder destas experiências, e no seu encalço pela net lá encontrei mais informações e o seu site - http://www.atelier-yanagi.com/.



Na página inicial do mesmo revelam, num tom despretensioso e até humorístico, a sua ambiciosa intenção de criar pranchas de surf 100% recicladas de desempenho seguro e performante. Depois, ao desfilarmos pelas restantes páginas do site, descobrimos o espírito puro e apaixonado deste inventor, bem como a sua competência que se esconde por detrás dum currículo recheado com um "MBA", um "MS. Product Development Engineering" e ainda um "BS. in Aerospace Engineering" tirados na Universidade da "Southern California".

Para aguçar ainda mais a vossa curiosidade, deixem-me cá recortar um pedaço do seu perfil:

"(...)
After finishing up my MBA degree, I decided to invent next-generation surfing product to pursue ultimate surfing and nature lifestyle. I believe that my invention will eventually turn surf environment and surfing lifestyle more sustainable in the future.

As Steve Jobs said, I would like to send a message to those who are still struggling to find their way to live for future.

'stay hungry, stay foolish' "


Fotografia de Chuck Ezpinoza.

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Set (II)

Segunda onda do set:



Pormenores / Details

Second wave of the set.

domingo, 14 de setembro de 2008

Set

Não sei ao certo, mas acho que foi em 1997 ou 98, há cerca de 10 anos atrás, portanto, que fiz uma série de desenhos de ondas a pastel. Na altura ofereci-as todas, aos amigos que gostaram e três delas à minha irmã. Sempre que a visitava pensava que as teria de fotografar, e hoje, com a máquina fotográfica à mão, finalmente, lá o fiz.



Pormenores

I don't know for sure, but I think it was around 1997-98, about 10 years ago, that I made a series of pastel wave drawings. At the time I gave them all away, some to friends that liked my work, and three of those to my sister. Every time I visisted her I thought I had to fotograph them, and today, with my camera close, at last, I did it.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Lines from a Poem


Depois de 10 dias de surf ininterruptos, a vida torna-se mais simples.

Apanhei todo o tipo de condições de mar e de vento, de sol e de chuva, até de crowd. A fish continua a ter muitas espinhas, o longboard a ser um "fiel amigo".

À medida que os dias se iam sucedendo, que vestia de novo o fato, que remava de novo para fora, que voltava de novo para casa, crescia em mim uma melodia, daquelas milenares que correm dentro das gentes e não se cantam, sorriem-se...

Soube da existência delas conjugando A Pérola de John Steinbeck com a 9ª Sinfonia de Beethoven: não precisamos ouvir para descobrir música, temos apenas de a procurar.

Neste caso a lírica era fácil de memorizar...

Fotografia de Ricardo Bravo


"faz-me falta um verso
onde o mar não termine

deus sobre as rochas"

Jorge Reis-Sá, A Palavra no Cimo das Águas

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

L.U.Z. - Life Under Zen



O Jun Matsui é um tatuador e artista de agenda bem preenchida, mas por entre a multiplicidade de actividades e intervenções artísticas a que se entrega tem arranjado a disponibilidade para realizar o excelente blog onde nos brinda com a sua vida e o seu mundo.

A par da exposição do seu trabalho ele apresenta histórias e reflexões que não me deixam de surpreender pelo seu cunho simples, humilde e profundo.

Ontem, depois de ler mais um dos seus textos, não resisti em vir aqui deixar a sugestão para uma eventual visita ao seu espaço - http://www.lifeunderzen.com/

E aqui fica um pequeno trecho do dito post que podem ler na íntegra seguindo o link - OAHU :

"(...) Ao longo dos anos tatuei pessoas de diversas nacionalidades, raças, idades e ocupações… o ceo, o mafioso, a advogada, o operário, a cantora, o jogador de futebol… às vezes me pego imaginando essas pessoas que tatuei e suas vidas, seu cotidiano tentando imaginá-las “em ação”… quantas dessas tatuagens estão escondidas sob ternos executivos? quantas são usadas para intimidar? para atrair? para seduzir? quantas são ostentadas como meros “acessórios” de moda? quantos acreditam que vestem um poderoso talismã capaz de mudar suas vidas e protegê-los da má sorte?

Não sei…e não importa.


Imagens como a do Binho naquela onda no Hawai me ajudam a voltar ao “centro” e pensar na tatuagem simplesmente como uma celebração do amor pela vida e pela liberdade. O desenho não faz a tatuagem e a tatuagem não faz o homem… no final meu amigo, sua tatuagem, independente do desenho e tatuador é somente tão bela, interessante e verdadeira quanto a vida que você vive…"

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Eiffel Tower


Os cromos em linha...

E o nosso amigo Phillip MacDonald vence em Ribeira d'Ilhas subindo para os lugares cimeiros do WQS e tornando mais real o sonho de regressar à divisão principal do surf mundial.

Nas férias encontrámos-lo em Mundaka e antevendo-lhe a vitória prestámos-nos à figura de cromos.

"Hey Phillip can I take a picture with you?"

O gajo pareceu-me um porreiro e teve a paciência e simpatia para, de sorriso, posar para a foto... comigo... com o o Rui... com a Lena... e ainda para rir da minha tirada:

"It seems that you look like Eiffel tower today, Phillip, everybody wants to take a picture with you! Thanks mate and good Luck to Ribeira!"

E não é que teve!

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Eskerrik asko Mundaka *



Acordámos assim, num parque de estacionamento junto ao mar e com uma vista previligiada sobre a pequena ermida de Santa Catalina. Apesar do tamanho, esta capela é um dos ícones maiores de Mundaka e não o será, com certeza, apenas pela beleza dos traços despretenciosos e minimalistas que lhe definem a sua arquitectura gótica-renacentista, a razão passará, igualmente, pela força da sua envolvente que lhe é oferecida pela localização estratégica numa pequena península à entrada do estuário. Dali sente-se todo o deslumbramento e força da paisagem, marcada, essencialmente, pela entrada franca e poderosa do Atlântico rio adentro.

Tínhamos chegado a Mundaka no fim da tarde do dia anterior, mas constatámos que o parque de campismo local, onde pretendiamos pernoitar, estava completo. Sem grandes alternativas e confesso, também sem grande embaraço, improvisámos a estadia num dos parques de estacionamento, que, com a vista oferecida se converteu em espaço de excelência e exclusividade para o efeito.

Com os três carros e a caravana devidamente aparcados junto uns aos outros e após assentado arraial, pouco mais tempo tivemos nesse dia do que para ir morder o ambiente local e um bife de ‘ternera’ na esplanada do Bar Txopos, mesmo junto ao porto onde atracam os barcos e de onde facilmente se pode dar entrada e saída para surfar.

Se pelas muitas fotografias penduradas nas paredes do bar com os tops mundiais a erguer copos para a lente e pelos posters e pranchas rubricadas pelos mesmos, se percebia desde logo que nesta terra o surf tem grande expressão, descobrimos que as ruas e o ambiente que nelas se vive, também o transparecem na mesma medida.

Não como noutra qualquer cidade à beira-mar plantada, em que cada loja vende artigos de surf, ou, não o fazendo, utiliza a sua imagem para vender o que quer que seja. Ali o surf parece estar um pouco para além do consumismo desenfreado, talvez seja menos explícito, mas nem por isso será menos perceptível.

Não será certamente imediato pelo ambiente, agradavelmente solto embora ordenado e clássico, as ruas estão bem acabadas e arrumadas e não sendo austeras têm a sua opulência. Numa terra originalmente de pescadores, todo o casario nasceu debruçado para o mar, mas a ideia que fica, a dúvida que persiste, é se não terá sido antes disposto românticamente para a beleza da onda.

Mas, dizia eu, mais do que pelo desenho da cidade, a presença do surf nas ruas pode compreender-se e sentir-se pelo retorno e investimentos local realizado em resposta à notoriedade e riqueza que a onda lhe ofereceu.

Talvez por viver em Portugal, onde tantas vezes vemos estes recursos naturais desprezados, me surpreenda esta simbiose e proveito mútuo entre onda, surf e localidade, mas ela está presente até nos mais pequenos pormenores, como nos corrimões em inox, por exemplo, que foram colocados em várias formações rochosas e que servem quase exclusivamente, de forma funcional e nobre, os surfistas a entrar e sair do mar em segurança, ou nas brochuras que se encontram nos postos de turismos e que revelam invariavelmente na capa a onda e o surf, ou ainda, de forma ainda mais óbvia, nas tabuletas que sinalizam a entrada em Mundaka com o brasão da cidade lado a lado com um surfista à porta de um tubo.

No entanto, é com a maior subtileza que o surf se revela por entre as ruas desta terra basca. A esse propósito lembro-me de imediato do comentário perspicaz que o Maya, um dos companheiros de viagem, deslumbrado pelo burgo, lançou enquanto as percorríamos, referindo o quanto se notava que Mundaka era uma terra de surf pela postura mais relaxada e tranquila das gentes da cidade.

De facto, enquanto checávamos o mar, alimentando esperanças de uma boa surfada no dia seguinte, avós, pais e filhos, passeavam calmamente com os miúdos, entranhados duma estranha tranquilidade de fim de tarde, que, para quem pratica surf, facilmente reconheceria ser da mesma natureza da que nos invade após uma boa surfada!

O mar estava pequeno quando nos deitámos, com a pouca luz e sem qualquer referência que nos desse uma noção real de escala era difícil avaliar, talvez tivesse um metro nos sets, se tanto, mas sei que foi ondulação suficiente para, na caravana, se ouvir de forma vaga e me embalar numa noite de sonhos cheios de drops em ondas perfeitas.

Um ruído forte de umas quaisquer obras vizinhas acordou os miúdos bem cedo e estes, sem cerimónias, acordaram-nos a nós. Ainda deitado, abri a janela da caravana para deixar sair o ar viciado da noite e deixar entrar a frescura marítima e todos os odores oceânicos que a manhã carregava. Lá fora, para além do barulho ocasional e inopurtuno dos martelos pneumáticos, ouvia-se o som abafado de ressaca da violência do impacto das ondas nas rochas. O mar tinha subido e naquele momento, ao olhar para aquela panorâmica triunfal, percebi que, para mim, a verdadeira grandeza da pequena ermita de Santa Catalina se justificava, não por dominar qualquer movimentação marítima de entrada e saída das embarcações de Mundaka, mas sim por vigiar a chegada de novas ondulações... como que a abençoá-las!

* Muito Obrigado Mundaka

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Simbiose

Foto de Leroy Grannis


do Gr. sýn, juntamente + bíosis, modo de vida

s.f.,
relação mutuamente vantajosa entre dois ou mais organismos vivos de espécies diferentes. Na relação simbiótica, os organismos agem activamente em conjunto para proveito mútuo, o que pode acarretar especializações funcionais de cada espécie envolvida


Ninguém me tira da cabeça que elas também ganham com isto...

domingo, 24 de agosto de 2008

Citius, Altius, Fortius.


No momento da criação deste nosso tasco cibernético avisámos alguns amigos que estávamos a juntar os trapinhos (esclarecemos desde logo que, mesmo sem homofobia, não havia abixananços e comunhão apenas de interesses e ideias).

Quais contrabandistas dos tempos modernos, partilharíamos as histórias e riscos das travessias da última fronteira que Schengen deixou em pé neste cantinho da velha Europa. Abríamos as portas das nossas experiências... e encontrávamo-nos do outro lado.

Ainda que com uma periodicidade próxima da que condena ao Purgatório, gosto de pensar que criámos algo à imagem da descrição de Buarcos, numa longínqua Surf Portugal: perfeito, mas tão inconsistente... Bom, 1 em 2 já não é mau.

No meu caso, falar de surf com o cuidado e intensidade que aqui pretendo tem um custo de oportunidade elevado. Pouco ou nada do que aqui escrevo é inventado, de forma que, para o transmitir, tenho de o sentir. Conjugada a dependência deste – escolher entre as hipóteses seguintes: desporto; vício; modo de vida; culto; outro - à vontade dos Elementos, essa vivência nem sempre é possível. Depois, se o mar não estiver bom, existe ainda todo um outro mundo de interesses. Se estiver, transmi-quê?

Tudo isto por não ter assinalado convenientemente o 1º aniversário do Vagueares (o Pedro estava a ultimar um seu e o Luis já andava num dele). Ainda pensei justificar que o dia ainda não tinha chegado, calculando o tempo que levariam os corpos celestes do nosso Sistema a reposicionarem-se como naquele dia 6 Agosto, mas se a contribuição gravítica da Lua e do Sol são suficientes para as marés, para quê complicar a coisa? Deixámos passar a efeméride, mas se o aniversário do outro, se bem que filho Dele, é quando um homem quiser, do que não resultará a vontade de três?

Depois, este – aplicar o termo escolhido anteriormente – é uma experiência nominosa (palavra que terá direito a um ou dois posts mais à frente) e vai algo além de certas grandezas definidas. O tempo não é o mais importante.

Como vimos por estes dias, é o que escolhêmos fazer com ele que conta.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

É amanhã dia 1 de Agosto


Fotografia de Ryan Tatar



É assim que versa o início de uma música de Xutos, não sei se conhecem, mas a mim oferece-me um efeito muito semelhante ao de um hipocondríaco a ouvir falar de doenças, toda a letra me transporta de imediato para a realidade cantada... ou pelo menos para uma série de imagens, que são aquelas que a nível muito pessoal, me traduzem o Verão e as férias durante o mesmo.
Amanhã não é 1 de Agosto, mas é como se fosse, porque amanhã parto no meu primeiro dia de férias.

Vou numa surf-trip em que a ideia passa por partir costa acima, chegar à Galiza e seguir costa ‘ao lado’, passar pelo país basco e chegar às praias francesas em plena euforia dos QS’s.

Não há pressas e a única verdadeira meta é a mesma que se revela nas últimas linhas do ‘1º de Agosto’ dos Xuto.

É amanha dia 1º de Agosto
E tudo em mim é um fogo posto
Sacola ás costas, cantante na mão
Enterro os pés no calor do chão
É tanto o sol pelo caminho
Que vendo um, não me sinto sozinho
Todos os anos, em praias diferentes
Se buscam corpos sedosos e quentes

Adoro ver a praia dourada
O estranho brilho da areia molhada
Mergulho verde nas ondas do mar
Procuro o fundo pra lhe tocar
Estendido ao sol, sem nada dizer
Sorriso aberto de puro prazer

Eu vou dando novidades!

sexta-feira, 18 de julho de 2008

"O Rei tem orelhas de burro!"


Embora variando o título real da personagem com tão equina característica, a moral dos contos em que esta frase aparece permanece invariável: há segredos impossíveis de guardar só para nós.

Tendo eu um desses, mesmo sabendo que este é o primeiro passo para o revelar, vou tentar mantê-lo longe dos canaviais por mais algum tempo. Primeiro, porque está visto que o método descrito naquelas histórias não funciona muito bem. Segundo, porque se a inapelável necessidade de o gritar a plenos pulmões se manifestar, então que me sirva de mote para aprimorar a mui nobre e buracosa 'Arte da Tubaça'!

Entre o quebrar das ondas e o canto das sereias, não será fácil descobri-lo... E quem sabe se daqueles a quem a curiosidade aperte na procura de segredos envoltos no mar, possa até surgir uma nova narrativa sobre o povo que nas mãos lhe ouvia a voz...

Depois conto-vos.

Fotografia de Daniel Gomes, Buzios

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Será desta que pinto a caravana?!


Carreguem sobre a imagem para a ver maior.
Inspiração nas ilustrações de Camila Ingman!


À falta de domínio de Photoshops, Coreldraws e afins, foi mesmo em Autocad que tentei materializar uma das ideias que tinha em mente, acho que o meu puto T vai gostar!

Aceitam-se e agradecem-se sugestões!

segunda-feira, 30 de junho de 2008

What are little girls made of?



What are little girls made of?

Sugar and spice and all things nice
That’s what little girls are made of!

What are little boys made of?
Snips and snails, and puppy dogs tails
That’s what little boys are made of!


“(...) elas, as mulheres, pensavam em nós, concentravam-se perscrutavam, decidiam – aceitar-nos, rejeitar-nos, mudar-nos, matar-nos ou simplesmente viverem connosco(...)” *

Já nós pouco mais conseguimos fazer para além de nos entregar ao que mais gostamos, ao surf, à praia, a uma cerveja, ao sol, ao surf...

Sobra-nos, talvez, em determinadas ocasiões, pouca sensibilidade para lidar convosco.

Desculpem meninas, e nunca esperem muito do género masculino, de uma forma geral somos gente muito básica.

* Charles Bukowski - “Mulheres”

Idiossincrasias


Citando de cor uma passagem de um livro de História do meu 5º ou 6º ano, 'Se a história da Terra fosse cronologicamente encaixada num filme de 100 horas, o Homem aparecia nos últimos minutos'.

Porque acredito no binómio respeitar para ser respeitado, não sou adepto de quaisquer manifestações de localismo, mas ao olhar para todas voltas demos ao pico nesses últimos minutos, em muitos e tranquilos spots já há algum tempo nos tinham recambiado para areia sem que eu levantasse sequer um pingo de indignação. Vai-nos valendo o wu-wei'ian way de Gaia...

O meu activismo ambiental não vai além de algumas regras cívicas relativamente básicas. Os meus ideais políticos nunca foram algo que estendesse para fora de discussões mais acesas em rodas de amigos. Mas quando há real hipótese de alguém que já passou algum tempo em cima de uma prancha ocupar a cadeira mais mediática e decisiva do mundo, até em mim isso acaba por criar expectativas. Porquê?

Existem hoje desenvolvimentos tecnológicos tão avançados que a mim, como por certo a quase todos os que possam ler este texto e não sejam investigadores do CERN ou algo do género, soam a efeitos especiais. Simultaneamente, existem hoje retrocessos sociais tão gritantes que a mim, como por certo a todos os que possam ler este texto e não sejam Ditadores de Carreira, soam a passagens do guião d'A Guerra do Fogo. Mesmo quando as há, as demonstrações de consciência cívica local, nacional ou global, que de forma eficiente tentam conciliar as duas questões anteriores, de pôr a tecnologia ao serviço do bem comum, acabam por passar desapercebidas face à dimensão das disparidades. Isso é, à falta de melhor palavra, triste.

Já vimos que, a curto/médio prazo, o resultado de alguém aparentando vontade, mas numa posição não deliberativa, será um documentário para as massas e um conjunto de conferências de sensibilização para plateias, mais ou mais ainda abastadas. Conveniente ou não, é essa a verdade.

Mas... E se tudo isto mudasse?

E se a vontade férrea de alguém com capacidade deliberativa pudesse, realmente, marcar a diferença? E se, de alguém que já exasperou, cinco minutos que fosse, por falta de ondas - ou pior, pela sua existência mas impossibilidade de delas usufruir! – dependesse a decisão suprema do convergir das necessidades tecnológicas e sociais do Mundo? Então, porque nesse alguém existe o mesmo querer com que todos nós remamos para a primeira onda do dia depois de muito tempo sem surfar, não seria plausível pensar que essa decisão é possível?

A questão do Surf nesta equação é mais ou menos idiossincrásica. Eu vejo o correr de ondas de uma forma intensa, como outras pessoas verão outros aspectos das suas vidas, mas há algumas nuances que me fazem acreditar que esta argumentação assenta melhor sobre a água. Por exemplo, Carl Sagan, no seu livro Contacto, coloca esta questão: "[...] Seriam os mundos de civilizações mais avançadas totalmente geometrizados, inteiramente reconstruídos pelos seus habitantes? Ou a assinatura de uma civilização realmente avançada seria a de não deixar absolutamente nenhum sinal? [...]". Eu escolho o que estiver atrás da porta nº 2...

Como podem ler aqui, claro que estão lá os fatos, as pranchas e restantes acessórios, todos eles produzidos de e/ou com materiais poluentes, pelo que, por mais que nos queiram vender o contrário, esta ainda não é uma auto-estrada com via verde. Mas quando numa onda, por mais rápido que se vá ou maiores que sejam as 'nuvens de poeira', as marcas desse trilho são quase instantaneamente apagadas... E quando, em locais 'naturais', do mar olhamos as praias alisadas ou as encostas esculpidas, resultado daquelas 99 horas e alguns minutos de trabalho perseverante...

Mesmo que idiossincrasicamente, parece-me uma demonstração clara, qual combustão espontânea de conhecimento, livre e à distância de um olhar, de um caminho em que decisões civilizacionais poderiam ser baseadas. Se um dia destes vir o Obama no line-up pergunto-lhe se não podíamos experimentar esta aproximação na condução dos destinos do mundo:

Hey Obama, can we...

domingo, 29 de junho de 2008

Out of Time



E andámos tão ocupados ultimamente que quase nos esquecíamos que o mundo também gira delicada e deliciosamente para lá do tempo.

Recorremos ao essencial, tudo o resto me pareceu estar surpreendentemente à mão.

Vieste ter comigo e partimos de seguida, já de noite. Chegámos à praia um par de horas depois, ‘lançámos’ a tenda numa duna e estendemos-nos à Lua.

Por experiência levei uma garrafa, e pouco depois, rapidamente, naquela situação que me era tão estranhamente familiar, soltámos-nos do mundo para o nosso universo pessoal.


Amanhecer na 1ª linha de mar.


Orvalho matinal sobre a tenda.




Armérias, flora endémica lusitana.


Há sempre uma garrafa para beber e uma mulher para amar...


Não, não me esqueci da prancha... Foto pré-matinal solitária.

Fotos do próprio.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Wo Hu Cang Long




Estive para deixar passar Maio sem escrever por, no que toca a ondas, lhe ter visto pouca virtude...

Voltei para casa, quase sempre soprado por ventos, adversos, soando a suspiros, desabafos. A perfeição também cansa e, segundo rezam as crónicas, foi um Inverno perfeito.

Tentei preencher esse tempo com o Método Miyagi de wax on, wax off (ou vice versa, para ser mais exacto) e um ou outro filme, mas a combinação olfactiva e visual dos dois teve um efeito contrário ao pretendido, inquietando-me.

O mandarim do título remete para um felino agachado, pressentindo perigo, e um dragão escondido, aguardando. E tem aqui tanto de prepotência como de delírio...


___"[...]
___I must go down to the seas again,

___________to the vagrant gypsy life,
___To the gull's way and the whale's way

___________where the wind's like a whetted knife;
___And all I ask is a merry yarn

___________from a laughing fellow-rover
___And quiet sleep and a sweet dream

___________when the long trick's over."
___John Masefield, Sea-Fever


segunda-feira, 5 de maio de 2008

Carneirinhos contemplativos em terreno baldio com vista para o Mar


Edward Hopper, "Rooms by the sea"

"Há aquelas noites em que nos deitamos e que mesmo cheios de sono não conseguimos dormir.

Sabes como é, não é?

Por vezes parece que o frenesim insiste em nos acompanhar, ou que a inquietude se instala, ou ainda que somos invadidos por todos os pensamentos do mundo de uma só vez.

Nessas noites, mais do que à contagem de carneirinhos a pular a cerca, costumo recorrer às maiores ondas que já surfei... e volto a dropá-las.

Sabes? Adoro mesmo aquela sensação de olhar para baixo e, convicto, seguir caminho!

Nessas minhas fantasias tenho ainda a mais-valia de tudo suceder em câmara lenta, dando espaço para um deleite infinito e absoluto desses, que costumam ser apenas, breves instantes.

Acho que, ao fim ao cabo, o que vou buscar neste exercício nocturno é aquela confiança de que fazemos uso para um drope bem sucedido, a mesma que nos faz acreditar, nos momentos que o precedem, na nossa capacidade para o realizarmos.

E isso é arma quanto baste para me fazer vencer qualquer dos eventuais problemas que se queiram vir deitar comigo!

Por isso, Vera, parece-me que fizeste bem em registar devidamente essas tuas primeiras experiências 'surfísticas'... de momento podem ser apenas uma recordação agradável, mas quem sabe se não te poderão um dia valer numa noite de insónia!

*
Pedro"

Em resposta ao Post da Vera no seu espaço Índigo, com a devida edição que se impunha, dada a hora a que foi feita.