sexta-feira, 15 de maio de 2009

Sexo



Apesar de pai de 3 lindas crianças, não me tenho como um surfista ressabiado - óbviamente que o meu anúncio preferido em qualquer revista de surf seja o da Reef, mas pretiro uma Surf Portugal ou Onfire a qualquer Soup num abrir e fechar de olhos… muito pelo conteúdo mais artístico e menos pretensioso.

Quando pequeno vivi um drama de dicção e ortografia. Julgo que por ser filho de emigrantes e não falar a língua mãe até aos sete anos de idade… entendia perfeitamente o português mas não articulava nada que não passasse pelo francês. Talvez daí a minha frase favorita, à época fosse uma derivação do rato e da rolha do rei da Rússia… estranhamente também nunca conheci Paris.

Ontem ao fim da tarde e depois de um dia de labuta intensa parei a chécar o swell antes do regresso ao lar doce lar, e como qualquer membro desta tribo do sal desesperei com o onshore fortíssimo que rebentava toda a santa linha que entrava bancada a dentro… ‘mais um dia sem surfar’. Deu-me para o pensamento e para a nostalgia…

A ampulheta e o broche. Felizmente que volvidos que estão quase 36 primaveras já decalco o sentido sexual destas duas palavras e cinjo-me assim à beleza respeitosa do termo. O broche não sei porque raio está nesta prosa mas seria para enfeitar uma lapela e não para tornar o fim de tarde mais promissor dada a espuma desordenada que me afligia a alma. A ampulheta – e porque se de alguma forma pudesse estar associado ao primeiro termo (se estivéssemos a levar isto para a sacanagem e dado o meu problema de dicção me enganasse no ‘Lê’) – mais não me ocorreu que a contagem de tempo.

O passar da areia pelo estrangulamento vítreo vs a nossa necessidade de quantificar o tempo. Existe também o dilema do meio copo cheio e do meio copo vazio. Alinhados que estão os termos da equação o que me ocorre são as ondas que já surfei… as memórias de adrenalina, velocidade e sentimento de preenchimento… aquela nuance bíblica do ‘caminhar sobre as águas’… dos sorrisos rasgados e dos episódios com os parceiros de Neptuno… e em que parte da ampulheta? Na areia que vagarosamente deixámos passar? Ou na que perdura ainda no bordo superior do vértice?

Estive agora 90 dias a olhar para a areia. Sem verdadeiramente a sentir, apenas a vê-la escorrer por entre os dedos… tudo o bom que possuo parece-me um pouco destemperado sem este sal que nos corre nas veias. Pensei na quantidade de areia que me faltaria mas tal poço relativo ao fundo, não lhe vislumbrei o topo… felizmente que assim o é ou temo que a algum tempo do fim poderia perder a pica de apanhar o set, de remar para a melhor!

Tanta gente me rodeia e demasiados com os olhos vazios e sem sal na vida. Obcecados pela ganância de ter um aquário maior que o do vizinho sem nunca conhecerem o prazer que é partilhar uma praia com os demais e uma onda com um Amigo.

Grão a grão a areia esvai-se e o copo fica cada vez mais cheio… ou vazio.

5 comentários:

Thifacco disse...

"Tanta gente me rodeia e demasiados com os olhos vazios e sem sal na vida." - também vejo muito disso, não só pelo surf, mas são muitos que não se fazem melhores por não possuir um estilo de vida próprio!

Gusy disse...

Oh Rudas, não devia ser "pretiro uma Soup a qualquer Surf Portugal ou Onfire"?

Rudas disse...

Olá Gusy,
preterir - Conjugar
v. tr.
1. Ir além de; ultrapassar; deixar atrás; passar em claro.
2. Prescindir de.
3. Omitir.
4. Deixar (sem motivo legal) de promover a.
5. Ser promovido no lugar que competia a.

preferir - Conjugar
v. tr.
1. Dar a preferência a.
2. Estimar mais, escolher, antepor.
v. intr.
3. Ter preferência, ser preferido.

Resumindo... eu prefiro a Soup e pretiro a SP... tá bom assim? Abraço

Gusy disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Gusy disse...

Ahhhhhhhhh, o pretiro passou-me ao lado, li como se fosse prefiro!
Bom texto, btw. Fazem falta no forum!