sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Dear & Yonder


Imagem de Leonardo Hernandez, Mermaid Song


Tudo o que ele lhes reservava era a espera...

Recebia-lhes os amores feitos marinheiros, pescadores ou viajantes... e deixava-as esperar. Talvez por inveja – das promessas oferecidas, da saudade provocada ou simplesmente do desejado regaço, onde mesmo os mais fiéis e dedicados lobos procuravam abrigo – nem sempre os devolvia. Era o tempo em que elas vestiam de negro, sinal de espera interrompida, e se afastavam dele.

Ele, sem idade. Elas, de todas as idades. Regendo seus humores pelas mesmas fases da lua e, aparentemente, de costas voltadas entre si...

Vêem-se cada vez mais silhuetas femininas correndo para o mar. Entre outras cores vestem de negro, em sinal de espera interrompida, para o correr nas ondas. Ele recebe-lhes os amores, agora sem intermediários: silhuetas curvilíneas sobre silhuetas curvilíneas. Em vez de semblantes carregados de outrora, geram expressões serenas. Por vezes até sorrisos...

E pouco a pouco, a conta-ondas, na memória que cresce na corrente do tempo um luto desagua em alegrias.

Talvez ainda haja uma réstia de inveja. Afinal ainda existe uma espera, a de entre sets, entre o muito que ele lhes reserva... Mas agora, talvez mesmo essa se possa desvanecer. É que enquanto outros plágios marinhos nunca tiveram o brilho original, as sereias sempre foram símbolo de todos os desejos.

Talvez as esperas mais não fossem que uma difusa mensagem marinha de um desejo dele, o mar, para elas, mulheres: deixar de as esperar.


"[...]
Sou a Estrela do mar, só a ele obedeço,
Só ele me conhece, só ele sabe quem sou,
No princípio e no fim.
Só a ele sou fiel e é ele que me protege
Quando alguém quer à força
Ser dono de mim[...]"

Jorge Palma, Estrela do Mar

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Um Dia na Praia


Ofereceram-me há uns dias atrás este livro de ilustração infantil, um género, diga-se, que é bastante apreciado cá em casa.

O seu autor é o Bernardo Carvalho, nome que se me tornou familiar pelo seu blog Tubus-Eternus - Aqui no Vagueares é dos nossos preferidos e já há muito que o trazemos na nossa "linkografia" - e que tenho visto a assinar diversos títulos para a Editora Planeta Tangerina (alguns deles já nas prateleiras cá de casa).

Achei que era pertinente agradecer e partilhar aqui a agradável surpresa que tive ao abrir o livro e ver a  ilustração que o próprio teve a amabilidade de me dedicar.



 Obrigado

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Acção de Limpeza de Praia

Transcrição de um novo tópico colocado no fórum Atitude-Surf pelo Presley:

"Vieram? Gostaram?

Estava imensa gente não estava? 20 mil disseram eles, ali no Pico da Mota.

Pois bem, o Bruno Bairros marcou o ritmo e mandou o seguinte email para toda a gente. Agradecia que quem puder se chegasse à frente:



Bom dia

A Surfrider Foundation vai organizar pela 1ªvez em Peniche uma acção de limpeza de praia.

A acção terá lugar na praia do Point Fabril (entre a Almagreira e o pico da Mota).

Dia da acção será Sábado dia 28 Novembro ás 14.00 horas.
Vimos por este meio convidar todos os que se interessam e preocupam com o aumento significativo de lixo nas praias da nossa costa a participar como voluntário nesta acção.

Devem-se inscrever no site da surfider foundation tendo acesso imediato a um seguro de participação. Aqui segue o link:

http://www.initiativesoceanes.org/thecleanups.php

Neste dia serão distribuidas luvas e sacos especiais reciclados para colher o máximo de macro resíduos, que depois serão enviados para um centro de reciclagem.

Esta acção será mediatizada como forma de alertar a União Europeia para o problema dos macro resíduos nas praias, que ainda não estão catalogados como poluição, por incrível que pareça.

Não fiques indiferente a este problema! Esta acção simbólica pode ser apenas o começo de algo mais concertado e com continuidade no futuro.

Vem ajudar a limpar ! como surfistas e amantes da natureza temos uma responsabilidade acrescida.


Bruno Bairros
"

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Festas da Exaltação de Nossas Sessões de Setembro



Deveria ter uns oito anos e era o primeiro dia de escola depois de umas férias imensas.

O Outono parecia já assomar-se à janela entregando-nos o sol a rir; Como era linda a minha sala de aula com aquela mancha enorme de sol a rir, a derramar-se sobre nós pequeninos, projectando as nossas sombras e a geometria rigorosa da janela no chão encharcado de ouro.

Lembro-me também das partículas de pó

(engraçado lembrar-me das partículas de pó)

que flutuavam a brilhar e se deixavam ler nos raios de luz que atravessavam as vidraças.
Nesse dia a professora entregou-nos uma folha em branco para, nesse início tímido de Outono, desenharmos o Verão.

Em cada uma das carteiras uma folha em branco que o sol – à gargalhada – tingia de amarelo!

Desenhei então as férias, porque o Verão, para um miúdo de oito anos, são as férias. Pintei a praia: um mar azul, a areia, um sol. Depois, num solar laivo de inspiração, coloquei-lhe um largo sorriso.

Sorrio também.

Enquanto remo para fora, penso, por entre braçadas tranquilas, que ainda é esse dia de escola que permanece a definir a minha ideia de Outono… Talvez agora lhe troque, apenas, os substantivos.

Já não é o início da escola que me vem assinalar o fim do Verão imenso; Agora é a deslocação para Sul das baixas pressões subpolares que o faz, por entre rufos de tambor,

(juro que por entre rufos de tambor)

trazendo-nos novas ondulações! De resto tudo igual, o mesmo regresso ao recreio, a mesma liberdade oferecida pelo espaço livre de uma folha em branco – em jeito de onda – mas igualmente tingida de reflexos amarelos a permitir-nos (re)começar tudo de novo!


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Chocolate


Não sei bem o que vi nela nem o que fez para o despertar em mim… apenas aceitei que talvez fôssemos predestinados e que no mundo não havia espaço para mais alguém.

O calor da pele morena ou secalhar a química submersa… tudo na nossa vida possui salinidade e talvez a minha tivesse falta de alguma. Dediquei-me então áquele ser… um momentâneo jogo de olhares e inerente passagem ao dos sorrisos. Dei-lhe tudo sem nada pedir. Ela acedeu em fazer não menos que o mesmo. Prolongadas juras de um amor que ambos tínhamos como impossível, quase tanto quanto de efémero.

Do meio da multidão fez-se silêncio e o meu respirar ecoou até a alcançar. Entregou-se-me e inevitavelmente tomei-a. Entrei nela e juntámos as nossas ansiedades, confessámo-nos em uníssono mas no fim não passei de um cobarde.

Vivi com ela toda aquela intensidade, viagei meio universo mas regressei só… depurado, rejuvenescido e indecente o suficiente para partilhar o nosso momento com outros. Feliz por já não nos ter presente noutro modo que não em pensamentos. Sem prova viva do que nos uniu que não eu... e talvez a minha prancha.

Novembro 2009
Maré Vaza na Praia de Super Tubos
10AM, metro e meio, glass c/ offshore moderado e água barrenta.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Ponto de Luz

Sara Tavares, Ponto de Luz



'Quer ajuda?', perguntei. O olhar doce, emoldurado por rios de rugas que lhe corriam pelo rosto, antecipou o sorriso com que me recebeu a oferta. A rua não é particularmente movimentada mas, aproveitando a oportunidade para a boa acção do dia, ao vê-la ali, dobrada sobre a bengala como quem carrega o peso invisível de todos os anos que tinha, prontifiquei-me a acompanhá-la. Não, não era preciso, mas aceitou na mesma. Com passos lentos mas certos, seguimos juntos o seu caminho. Depois, segui o meu.

...


Julgo lembrar-me de quase todas as ondas que fiz. Falo daquelas boas, com tudo no sítio, princípio, meio e fim. Infelizmente, a base para esta memória de traços aparentemente elefantinos é uma má condição física. Sempre que volto ao mar depois de longas ausências a história é a mesma: os poucos degraus evolutivos que subi a custo foram descidos deslizando no corrimão. Sem braços à altura da vontade, a opção pela qualidade em detrimento da quantidade é uma escolha óbvia. Vai-me restando a complacência do tempo, lapidando-me as memórias, com que vou verticalizando drops e prolongando hang fives.

Já dos elogios que me fizeram ao surf lembro-me de todos. Todos os três... Depois de os ter recebido comecei a olhar de uma forma diferente para essa Fénix que é o meu nível de surf. Queria estar à altura dos tais elogios, poucos mas bons, e recomeçar, no mínimo, no ponto onde tinha ficado da última vez. Mas, principalmente se estava com gente conhecida nesse renascer das cinzas, a já de si pequena janela de oportunidade de uma grande onda reduzia-se ainda mais por... vergonha. Como se houvesse maior embaraço do que o de entrar na água e não nos divertirmos... Como se houvesse outra razão para ‘cair na água’ além da de nela cair... Por isso, mesmo que as minhas expectativas nunca tivessem estado muito além desse ponto, do surf pelo surf, voltei a pô-las no nível certo.

...


Lembrei-me daquela história porque um dia destes, na espera por uma última onda boa que valesse toda a surfada, dei por mim a pedi-la, sem rodeios, só para mim. Uma boa, com tudo no sítio certo, princípio, meio e fim. Uma onda que se desviasse de toda a gente, que trouxesse o meu nome escrito e passasse por mim dizendo ‘quer ajuda?’.

Talvez lendo este texto se questionem, justamente, se eu não teria vergonha. Não, acho que não, mesmo que tivesse sido preciso. Seguiríamos juntos o seu caminho. Depois seguiria o meu. E mesmo que essa onda viesse a contar a história como eu faço agora, quando o mar enrola na areia, ninguém sabe o que ele diz...


((tipografado na FreeSurfMagazine nº15, Setembro 2009))

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Cor de Verde Sonho Quando Não o Deixamos Fugir





Esta single-fin descobrimo-la numa arrecadação do jardim  por debaixo de teias de aranha e sujidade.

– Se pudesse oferecia-te esta casa! – Diz-me ela com um certo ar reguila, apontando-lhe o dedo, enquanto passamos de carro.

É uma casa velha, um pouco degradada pelos anos.

Já pelo espelho retrovisor um cubo sólido de dois pisos que inspecciono: vãos regulares e um sótão por debaixo de um telhado simples de quatro águas. Há uma pequena janela que nele se destaca, é simpática, mas simultaneamente sinistra por dar ares de abandono. De alguma forma lhe deve estar a parecer assombrada, porque

– As assombradas são as que mais me palpitam.

– Se ma oferecesses até a relva à entrada lhe aparava! – Sorrio-lhe – Fazia uma horta lá atrás no terreno e passaria o resto do tempo a pintar-te paisagens marítimas. – Sorri-me.

Imagino que lá de cima, a toda a hora, em jeito de inspiração permanente, entre casa adentro a praia de Pantin. Não só o areal, não só as ondas – que por ali entram bonitas, solenes, como que a trautear notas graves em adágio – também todo o verde-galego, toda aquela montanha florida de árvores altas, e todas aquelas ancas e gestos femininos com que as encostas se dobram e trejeiteiam sobre o mar.

Seria fácil manter uma relação amorosa com este local, é fácil imaginar que aqui poderíamos ser felizes. Lembro-me então do Mark – O Mark é o inglês que nos aluga a casa onde estamos hospedados – ontem convidámo-lo para um churrasco, nós comprámos a comida e a bebida e ele, à grande e à inglesa, trouxe-nos mais umas quantas garrafas.

Eu escolhi o vinho pelo nome, “Señorio de Ondas” dizia o rótulo, não se revelou mau e o primeiro copo que lhe entreguei, logo após a sua terceira cerveja, ajudou seriamente ao desenrolar da conversa – até o meu inglês se lhe tornou mais perceptível… acho! Foi então, entre copos, que nos contou a sua história, como chegou aqui marinheiro e como a Galiza se lhe insinuou quando se acercaram a este troço de costa.

Quando vi o Mark pela primeira vez estava ele seriamente esparramado num cadeirão do seu jardim, todo loiro e despenteado, de roupa velha e furada a disfarçar com o maior dos desmazelos a grandiosidade da sua pessoa. Confesso que mesmo com o seu irrepreensível sotaque inglês lhe demorei a adivinhar mais do que um caricato assaltante de lojas de conveniência. Mas, afinal, aquele disfarce em modos relaxados, era apenas o resultado de quem está a chegar ao seu sétimo dia de criação e descansa depois de trabalhar duro na concretização dos seus sonhos.

Contou-nos que em Inglaterra lhe tinha dado para, de raiz, construir um barco-casa:

– Não tinha nenhuns conhecimentos de náutica… e poucos de construção, mas li muito, consultei pessoal entendido e acabei por fazê-lo com três pisos – ri-se – todo o dinheiro que ganhava era ali que o deixava.

De todas as formas, quando a paisagem galega se lhe insinuou, soprando-lhe solene e em jeito de sereia as suas notas graves em adágio, o seu lado de surfista sonhador logo se rendeu. Sem cerimónias, sem quaisquer remorsos, vendeu-o para custear esta velha casa.

– Fui eu que a remodelei sozinho. – Pois está claro!

As últimas gotas da garrafa que invisto para o copo inspiram-me:

– Devias pintá-la de vermelho, Mark, aqui parece ser típico, as molduras das janelas e das portas de branco e as paredes de vermelho-vinho. Com tantos carvalhos aqui à volta parece-me ser um bom local para envelhecer, não tarda muito e é aqui que teremos o verdadeiro e irrepreensível “Señorio de Ondas”.



Gosto da casa assombrada, concluo. É só construir o barco-casa de três pisos e já cá volto para tratar da compra!

sábado, 24 de outubro de 2009

Gazetando #3...


Air Jordy


Foot Fetish




Free surf 


Lay Back no Lay Day


Fim de tarde através das lentes


Phillip MacDonald com pressão


Kelly

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Gazetando #2...


Dane a voar na sua última onda do dia... curiosamente com o Slater à espera na areia.

Depois do anúncio do adiamento do campeonato para amanhã resolvi dar conta dos meus afazeres profissionais e estive toda a tarde a trabalhar... bem, toda não, ainda com alguma luz resolvi dar mais um salto à praia e até levei prancha não calhasse aquilo estar surfista-maçarro-friendly... não estava, mas também não estava enorme, apesar de ter visto logo à chegada uma prancha a partir. O nível de surf é que era incrível com meia dúzia de surfistas do Tour a dar conta do line-up.

Peguei na máquina fotográfica e à falta de boa luz fiz umas quantas experiências com a máquina.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Gazetando...

... pelo Rip Curl Pro Search em Peniche. Partilho aqui alguns bons momentos que captei ontem dia 20:


"Lines from a poem" - Molho Leste
(ainda não consegui identificar e aceito ajuda)


Kelly Slater a explodir - Supertubos


Chris Ward (seria? aceito ajuda novamente)
de todas as formas confirmo que aterrou


Aéreo Aranburu - nos Super


Postal Molho Leste - novamente o Chris (?)


Michel Bourez a voar nos Super




Toni Slater

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Endless Summer

... ontem gravei o meu.

O dia começou nada menos q extraordinário: acordei com alguém a pedir-me um biberon, algo q acedi e puxei-a para meus braços apreciando o q de facto interessa nestes estranhos enrêdos q nos prefazem os dias. Enquanto adormecia, apreciei a ausência de dores q me vinham fustigando os últimos dias, fossem nas solas dos pés dados os ouriços - da última entrada nos Côxos, ou musculares dadas as incontáveis surfadas das vésperas. Fechei os olhos e imaginei ondas de sonho e águas cálidas e, algo tão ou mais improvável de viver, manobras feitas no limiar do rail e a velocidades anti regulamentares. Momentos depois deixava a caçula na ama, afastando-me de sorriso largo enquanto esta acenava eufórica e parti rumo ao meu destino.

Tomei o café enquanto fingia instruír-me com o CM - como se assim conseguisse enganar alguém, fosse antes o Expresso e talvez... - e esfregava as ramélas e cabelo ainda salgado das sessões de véspera. Cruzei diversos picos e alguns surfistas preenchiam o lineup, versão muito curta para o q almejava. Segui então para o poiso dos últimos dias e rumei areal fora para uma entrada sumária num mar pequeno mas glass, fraco mas cavado... algo diferente se passava pois em pouco menos de 10 ondas não espetei nenhuma calináda... um chapelinho, linhas fluídas, alguns bons roudhouses... chamariz óbvio para as aves de rapina q cedo me circundaram.
No meu 'Endless Summer', não havia lugar a outros protagonistas pelo q, decidi abandoná-los traçando novo azimute e remei seguro para junto do meu ouro. O arco-íris esse, talvez por ser demasiado distante para alguns mas certamente por falta de ambição para mais q outros tantos, percorri-o em solitário trilho até q as costas e braços me pediram clemência. Sentei-me e o vidro tinha consumado todo o local prefazendo toda a superfície de aquífero. Centos de pequenas taínhas circundaram-me e trocámos bons dias... por certo nada ou ninguém nos estragaria a recente relação até q as linhas entraram.

Ignorei num ápice todos os meus novos amigos e aquilo q ao fundo me parecia pequeno e improvável, já perto transformou-se em luz. O meu ouro estava ali. Eram 11h da manhã do dia 1 de Outubro de 2009 qd comecei o festim. A água estava quente e os drops deixavam antever os litros de água q de seguida saltariam dos meus rails. Perdi-me em pequenas salas de silêncio para sair aos berros de alegria - sabendo contudo q ninguém naquele inóspido local me ouviria. Uma e uma vez mais aumentei e consolidei o meu reportório de manobras e ora depressa, ora devagar, as quilhas trilhavam o óleo salgado q benzia o palco. Temi q as cortinas corressem e encerrassem o epílogo - dado q nesta conjuntura económica os orçamentos são apertados - mas ao invés disso e já com o avançado subir da maré as condições foram-se aprimorando e o q começou por ser um reinado de direitas, alcançou o estatuto máximo da triangularidade. O meu pequeno e privado pipeline perdurou até às 14h30m altura em q abandonei os céus. As asas foram-me faltando e despedi-me delas deixando o portão escancarádo para q outro acedesse aquele pedaço de paraíso.

O caminho de regresso teria sido calvário se não o tivesse feito de mente ausente. Apenas o corpo resmungava com as mais de 4h30 de exigência sobre humana mas é algo q já se vem habituando desde tenra idade e o regresso a casa é imperativo pois é lá q está a outra ponta da ponte das 7 cores. Após a remada, nova caminhada e ainda apreciei dois duches em balneário de construção divina.

Voltei para casa exausto e mais leve q um pássaro mas sem grandes tiques de vedeta apesar de o filme ter ficado acima das minhas muito e por demasiadas vezes altas expectativas. Aos telefonemas q fiz e recebi e q invariavelmente me asseguraram terem estado diante de ondas épicas, repliquei q céu só há um e q no dia 1 deste mês tinha tido a indecência de não o partilhar com ninguém. Fui buscar o meu outro ouro e mostrar-lhes o q o pai tinha estado a filmar grande parte do dia, adoraram mesmo sabendo eu q nada daquilo era sequer comparável ao q deixei noutro lado...

Publicado in 'Atitude-Surf'

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Escadaria da Felicidade

Já lhes estava a tirar as medidas e penteava sôfregamente a prancha quando no meu Paraíso Privado tocou o telefone...
'-Está? Olha...a pequenita está com febre... vais com ela ao médico...?'
'-É pá... já estou de fato vestido...'
'-Pois... é pouca febre mas eu estou em Lisboa e não posso ir à ama...'
'-Vou só dar uma entradinha rápida e vou já lá vê-la...'
Tirei o fato não fosse cair em tentações, caí na água e surfei desalmado - o que vos confesso como sendo bastante díspare de 'desalmadamente'. O mar estava grande e glass, a prancha era pequena e eu não estava ali. Fiz quatro ondas e saí. Vesti-me à pressa e qd subia a escadaria, um velho amigo de infância, ex-dealer e agora já de bem com a vida - se bem que com algumas mazélas dos velhos tempos de loucura - aparece-me pela frente:
'-Então mano???? Onde vais a correr???? Não me vais deixar aqui sózinho com este swell não???'
'-Fosgasse pá, tenho que ir ali a casa ver como está a caçula e provavelmente sigo para o Hospital para as análises da treta...'
'-É meu, g'anda cena!!! Então vou buscar a tábua a casa e ficar aqui à espera que apareça alguém
que sózinho não vou lá...'

Praguejei o caminho todo... chamei nomes a todos os cá de baixo e mais ainda aos lá de cima. Não faço mais nada que isto e agora que estão estas ondas de sonho fico em casa?!?!? Quando chego ao infantário, a pequena ria eufórica - talvez sob o efeito do recém ingerido brufen - ligo à médica, directora da pediatria de Torres Vedras.

'-Sim, sim... tou a ver quem é... são os loirinhos da Boavista né? Esqueça lá isso... o que não faltam por estes dias são viróses!!! É Outubro e estão 32ºC... não está à espera de milagres não? Se quinta feira ainda estiver febril apareça mas vai ver que não é nada... hoje já cá vieram mais de 100 e não foi com 37 e picos...'

Caguei bem no gasóleo e nos buracos da estrada de terra batida. Acelerei que nem um louco e estacionei 3min depois, acabado de vencer o Dakar. O Bruno estava a descer as escadas e a fumar uma enquanto via a ondulação a desfazer-se contra a falésia. Mandei-lhe uma assobiadela eufórico!!!!

'-Puto!!! Vamos lá que a míuda já está melhor que nós dois juntos...!!!!'
'-Fosgasse mano, nem os bafos me estavam a convencer de entrar sózinho... vai ser do best'

Entrámos a par e levámos - a par -porrada à séria, uma sucessão de pesos médios, curta mas intensa. As séries entravam a passar a barreira dos 2 metros. A água continuava quente, límpida e o glass era apenas momentaneamente desajeitado por espumas de branco intenso.
Sentámo-nos no pico e rimo-nos. Fónix!!!! Isto tudo só para nós dois?!??!

As direitas estavam ainda melhor que as esquerdas e eu precisava de meter a cabeça em ordem.

Remei com a acuidade física de quem passa horas a premir o tórax contra o deck. A onda não passava de um cano. Resolvi não fazer o óbvio e precipitei-me bem detrás do pico. A adrenalina inundou-me o corpo e o típico calafrio de quem acaba de sentir congelar as veias fez-me raciocinar. Toda a minha atenção recaiu na única trajectória que poderia transformar aquele momento de incerteza e possível dor, num estado de paz e plenitude.

Lembro-me de passar em menos que nada os pés para os cm2 que a prancha me pedia e da minha mão direita pentear a água acrescentando assim mais um leme à nau. A partir daí... o silêncio logo seguido do eclodir do lip do meu lado esquerdo em jeito de orquestra de metais. O Bruno gritava e esbracejava tipo louco quando passei por ele. Eu não. Vivi estático sobre a minha montada, apenas corrigindo a trajectória com pequenas pressões ora na ponta dos dedos ora nos calcanhares, ora mais sobre o pé esquerdo, ora mais sobre o direito. Percorri então todo aquele imenso corredor de cores, sons e vida. Olhei para a prancha que se mantinha incrivelmente seca apesar de envolta em mar revolto, e depois para cima. O branco do foam tinha mudado de cor e o sol a pique fazia daquele tecto o mais belo dos vitrais... talvez por estar reservado a uns quantos previligiados, eu incluído apesar das recentes blasfémias.

A onda foi-se tornando mais pequena e saí imaculado do seu interior bafejado por um anjo de hálito doce.

Abusando da sorte apontei para a praia e após um bottom já em esforço entrei profundamente de rail na parede côncava que me ladeava. Milhares de gotículas se espalharam em meu redor e o offshore manteve-me sempre a vista lúcida mesmo quando já tudo parecia água. Pareceu-me que no mesmo instante tudo se recompôs e voltei a ter o verde do meu lado... subi a ladeira e deixei-me afundar no contra ventre.

O resto da surfada não passou do mais épico que poderia pedir. Ondas power, direitas e esquerdas, manobras de linha e uma velocidade que por diversas vezes fez vibrar as quilhas e produzir um assobio tal brigada de trânsito em cenário de excesso e respectiva coima.

Regressámos aos carros quase 3h depois, exaustos. As escadas pareceram-me bastante mais íngrimes mas a tranquilidade estava agora comigo... despedi-me do Bruno e hoje lá nos reencontrámos no mesmo local.

As ondas cairam para metade e só havia esquerdas. Os tempos entre séries era agora bastante maior e metemos a conversa em dia... volta não volta, lá vinha 'aquela de ontem' à baila.

Estou todo rôto nóvamente. Mas feliz!!!! Qualquer dia tenho mesmo que arranjar emprego... ;-)

De Rolling Stone a Supertramp

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Days (not just) passing by



Levantei-me ainda meio febril de uma qualquer viróse contra a qual embati este fim de semana e me reteve todo o Domingo pelo lar doce lar. (com excepção dos 20min prestados ao 'dever cívico'.)

Em pleno Outubro e sob um sol impiedoso, lá saí de casa com aquela sensação de nervoso miudinho pois o som tipo 'metropolitano nas proximidades' implicava que o swell previsto pelo w'guru estaria provavelmente à beira mar e não na bóia de medição. Sorte a minha que pela temperatura morna com que me acariciou a brisa vinda de Espanha, o prenúncio de mar perfeito estaria prestes a concretizar-se.

Minutos depois caminhava só pelo areal... com meia dúzia de pertences em saco à tira colo, tshirt ao ombro e prancha sob o braço. Assinei a minha presença c/ nada mais que pegadas e aparquei junto à queda de água de cuja nascente dizem provir a cura para as mais diversas maleitas do corpo e qui-ças, da alma. Despi-me de tudo e todos e procurei decisão célere para auferimento de qual dos breaks abraçar, em busca da cura para as minhas.

Como o que é fácil (perto) acaba por nunca ser a minha escolha acertada - e tantas vezes nesta minha caminhada se revelou que já percorri tanta distância extra para obter pouco mais que do mesmo - vagueei então um pouco mais por entre um labirinto de gigantescos monólitos, soltos e espalhados aleatóriamente mas com mais sentido que os de Santa Eulália no Algarve... feito criança, aguardei impacientemente que do outro lado do trilho me esperasse a Miss Reef Out 09 despida e sequiósa de pecaminar.

Nada mais encontrei que um pico de direitas perfeitas, quebrando solitárias sobre uma laje que possuía tanto de ráza como de excitante. Remei canal adentro e a água quente repôs-me a temperatura dentro de parâmetros salutares pois sentia-me fervilhar tanto pela excitação da descoberta quase alcançada como por ainda não me encontrar plenamente recuperado fisicamente.

Ficarei para sempre na dúvida se trocaria a orgia de 2h preenchida pelo reboliço de musas ostensivas, criadas e enviadas propositadamente para serem liquefeitas pelo toque de quilhas e rails, por fugazes 10minutos com a Miss que procurei mas não alcancei.

Ao fim ao cabo a questão estava sanáda antes de nascer e para meu belo prazer dei comigo de corpo totalmente durido mas saciado de sorriso idiota e aberto, a tomar banho todo nú - claro que só - numa cascata de água límpida, em praia deserta a menos de 60km de uma metrópole...

Já o vento tinha rodado quando volvia ao quotidiano e uma vez mais assinei, pé ante pé, a minha passagem pelo mesmo trilho. Cruzei-me já no fim da praia com um casal de turistas de idade já algo avançada, que deliravam com o azul da água e perfeição das linhas que enfeitavam o oceano... demonstraram estranheza pela forma como surgi - tão improvável - de um areal supostamente deserto, não deixando no entanto de me brindar com um very british' desejo de um resto de um bom dia, ao que respondi...

- 'Tks, You have a water fall just for you guys half a mile ahead... enjoy!'

A Mensagem


Ilustração de Vera Costa






"A Literatura, como toda a Arte,
é a prova que a vida não chega."

Fernando Pessoa


As certezas de Fernando Pessoa são assim,
têm o condão de se tornar minhas também.
À primeira vista estranho-as, depois...

Neste caso, pensei nela uns dias, como
quando uma música não nos larga o
ouvido e da qual, mesmo distraídos,
trauteamos o refrão. E de tanto pensar,
às tantas como a beleza que reside nos olhos
de quem a vê, ia-lhe lendo algum surf...

O surf como Arte… Somos nós que damos novas formas às ondas ou é o mar que nos molda a vida? Há quem jure que nada lhe falte enquanto surfista e, à luz daquela afirmação inicial, isso impossibilita-os de serem artistas… mas ao mesmo tempo, remam com todo o desejo do mundo para fazer a próxima onda... Provavelmente, a resposta será qualquer coisa de intermédio. Os relatos, fotos e os filmes de surfadas épicas serão a expressão das nossas memórias. Realmente, independentemente do autor, tem uma definição familiar...

Mas há medida que se reduz o que considero ser a sua essência, quando o leio também em frases de quem nunca pôs os pés numa prancha, sinto que até os adereços que levamos para dentro de água podem ser supérfluos. Quando, nas palavras de quem apenas imaginou o que faço, se dilui aquele sorriso misterioso que trago, ponho algumas questões em perspectiva...

Não há aqui nenhuma elegia ao empirismo. Não pretendo trocar a prancha por um livro ou, mais imodestamente, uma caneta. Arrisco então estas palavras, com mais desejo do que vaidade – desejo, que alguém lhe leia algum surf e, como todo aquele que sabe um segredo, alguma vaidade – porque talvez o surf não seja arte...

É que às vezes, mesmo por instantes, a vida parece-me chegar perfeitamente.


((Publicado na FreeSurfMagazine nº13, Julho 2009))

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Boa Zona



Ondulação, vento, direcções e período - as previsões pareceram-me tão evidentes que, tendo a possibilidade, achei sensato deixar o trabalho para depois.

Estaciono e subo a duna do costume, nesta praia mantemos a curiosidade até lhe alcançarmos o topo, só aí se abre a vista em jeito de posto de observação. Apesar de a escalar em segundos, principalmente nestes dias de bons presságios, aprendi a intuir pelo som da rebentação a qualidade das ondas, assim, mesmo que pelo instante da subida, sempre vou obtendo de antemão alguma informação.

Já cá em cima as linhas no horizonte confirmam o som abafado e forte da ressaca das ondas no banco de areia - não preciso de mais - em despropositados passos de corrida volto para o carro. Sei que não é a pressa que me vai dar mais ondas, mas o desejo de entrar na água já se me entranhou nos músculos.

Só depois do fato vestido é que me lembro que já tinha a coisa mais ou menos apalavrada para ir ter com o Rudas, lá para os lados dele está melhor, deve estar, em noventa por cento das ocasiões costuma estar. Mas enquanto entro na água e vejo a primeira onda a partir já penso que isso pouco importará, tirando talvez a boa companhia, mas isso até ele pode dispensar - perante um bom cenário qualquer surfista se torna num surfista-egoísta - deixa-o apanhá-las sozinho lá, que eu apanho-as sozinho cá!

Como poderia eu recusar o meu spot quando ele se veste com as ondas que passo o ano inteiro a desejar-lhe? Sei que há melhor, lá para os lados do Rudas deve estar de gala, mas os cerca de 80km e a hora-e-qualquer-coisa de caminho que nos separam parecem risco demasiado a correr - aqui e agora está como eu gosto.

Depois de cerca de quatro horas de molho saio da água. Vou buscar a máquina fotográfica para tirar umas chapas e guardar estas ondas de recordação, relembrar-me que de quando em vez elas partem aqui assim. Há quarta imagem captada vai-se-me a bateria, ainda assim parece-me ter tirado as suficientes.


...

À tarde o Rudas ao telefone

- Estás a ver Indonésia? Tirando a temperatura da água, hoje cá esteve igual. Tenho pena que não tenhas aparecido.

a acompanhar pareceu-me que um riso sarcástico, a roçar o gutural. Imagino-o com uma lista na mão encabeçada pelo título: "amigos do surf a quem quero fazer inveja", mas, talvez somente por nunca ter ido à Indonésia, ao contrário dele, não fico muito afectado... ou isso, ou por ter enchido a barriga com as locais e singelas, mas tão minhas ondas desta manhã!

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Coices que a vida dá!



Foi num re-entry um pouco mais ousado que a quebrei ao meio. A onda nem era muito grande, mas a pressão que os meus pés fizeram sobre a prancha quando cheguei à sua base foi a suficiente para a partir em dois.

Na altura nem fiquei admirado nem muito chateado pelo que aconteceu. A prancha já há muito que se andava a queixar, velhinha, velhinha, a pedir a reforma pelo seu tempo de serviço. Eu ia-lhe fazendo ouvidos moucos, mas a pensar que sim, que estava na altura de arranjar nova companhia… só me faltava era o t€mpo, e sem t€mpo lá a ia levando de conserto em conserto aplicando todo a minha habilidade e mestria na aplicação do tape.

Tanto ding e tanto remendo só me fazia pensar que o que tinha ali era, basicamente, um “burro dos ciganos”… Não desfazendo - nem nos burros, nem nos ciganos, claro está!

Mas era do que me lembrava, da anedota do burro que trabalhava e não comia e que acabou por morrer para desconsolo do seu cigano

– Era tão, tão bom, conseguia trabalhar sem comer e agora que já estava habituado a não comer é que foi morrer.

Assim era a minha prancha... entretanto partida

– Ai o burro!

terça-feira, 22 de setembro de 2009


Arte de Jim Denevan


A areia acolhe os melhores versos!

Inteiros,

só no momento se podem ler...

... depois leva-os o vento e o mar.


Como na vida: a magia é um sulco no presente.

Aos Fins de Tarde!


..
Momentos captados com infinita paciência por Ana Nunes.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Bicho-do-Mato Órfão de Mar


Ilustração Vera Costa

Pelo menos uns quatro ou cinco quilómetros a mais devem ser, ainda assim permaneces em silêncio ao veres que tomo este caminho. Finjo parecer casual, assumo a postura séria de quem-não-quer-a-coisa, mas, do canto do olho, disfarçando, avalio-te a mudez. Suspeito que um sorriso… que talvez um leve sorriso a esboçar compreensão.

Por aqui é pela estrada ladeada de plátanos, aquela em que as copas se abraçam apaixonadas sobre todo o seu comprimento; Uma paixão que percebo e que tu sabes que eu venho procurar.

É de noite, faz algum frio, mas ainda assim escancaro as janelas do carro enquanto rolamos na inércia que nos trouxe até cá. Tentas comigo ignorar esta frescura nocturna, preocupado que estou em deixar entrar o canto dos grilos, enquanto, serena, aninhas o leve sorriso, agora de compreensão flagrante, no meu ombro direito.

Fragmentos de Lua tentam esgueirar-se através da cortina densa das árvores estilhaçando-se pela estrada e eu, tal copa de plátano, abarco-te com o meu braço livre completando o abraço apaixonado… e seguimos cheirando campo!

Sabes que quando estou assim sem mar, para mais de tanto tempo, me converto em bicho-do-mato; que estou, não estando; que sou como um bicho órfão de mar a chorar por dentro. Sei que sofres comigo porque me amas, mas nestas ocasiões, pouco mais te resta do que me abrires o sorriso e seres companhia nesta estrada. Lado a lado, acompanhados pelo choro dos grilos, ajudas-me a encontrar alimento alternativo para a alma - respigando aqui e ali os estilhaços de Lua. E eu, mesmo a guiar, arrisco por momentos fechar os olhos, na vã tentativa de acreditar que, afinal, aquele túnel de plátanos não é mais do que um tubo perfeito e infinito com que o mar nos abraça!

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Apenas uma questão...

...'o tamanho interessa?'

Por certo de modo instintivo e de forma a dar algum algum humor ao lineup, confesso-vos aqui e agora ter-me aflorado tal interrogação à parte de trás das pálpebras. Fruto qui-ças de alguma tarde de regadio - de relatos de feitos surfísticos antigos - bem passada em solo arenoso e sob brisa marinha bem temperada ou da sã vida que tem pautado o decorrer destas últimas semanas futuramente suspiradas mas de momento envoltas em mornas recordações de infindáveis horas de surf.

De um momento para o outro voltei a ter tempo para mim e dei espaço a alguns momentos de instrospecção. Num deles surgiu o tal dilema. Eu que até sou dos primeiros a prescindir da toalha antes de me envolver em neopreno! O assumido prelactor do... 'bora? já fui!' O surfista que jamais discriminou outro surfista por razões fúteis tais como: sexo, raça, sexo, marca de prancha, sexo ou cor do fato... e agora com dúvidas e condicionalismos de grandeza!

Talvez se num contexto futebolístico vivêssemos todos nós o internacionalmente famigerado 'síndrome do balneário'... mas nós??!?! Os gajos-eco-pró-natura-super-in ...? Os triologistas do Sal, Sol e Dunas? Vamos lá todos apreciar o offshore que o onshore cheira a cócó de gaivota doida? Como raio foi isto acontecer...?

Mas foi... algures entre o excelente livro de porta do carro e a entrada da tarde ou da manhã - confesso que as quase 4 décadas de navegação por mares lusos já não me libertam a acuidade necessária ao acerto temporal dos factos - despertei para a causa, inalei profundamente e arregalando os olhos, uma vez mais conjuguei as três palavras juntas e de forma avassaladora a minha mente resplandesceu com a clarividência de uma solução!

'O tamanho interessa?' - questionei-me e arrebatei eu uma vez mais antes de me decidir em partilhar convosco o sanar definitivo da dúvida.

Estacionei o carro numa falésia próxima, despi de forma segura a bermuda australiana e fiz-me às ditas, durante mais de uma hora, apenas tendo como testemunha - em terra firme ombreando feliz com lapas e mexilhões - a minha companheira de percurso, armada de canon sem lente escalativa que permitisse extrapolar o prazer de surfar sem viva alma nas redondezas...

De facto interessa mas por muito grande que a imaginassem, se nesta semana estiveram a trabalhar, apesar da evidente pequenez o prazer (gigante) foi todo meu...

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Radio Surf


Ilustração por Vera Costa


Era ainda ao ritmo da última música que havia tocado na curta viagem pós-surf que, equilibrando o 9´6 num dos braços e o tupperware com o neoprene molhado no outro, rodava a chave à fechadura da porta do prédio de quatro andares. Era uma porta velha de aço que mais parecia dar entrada a um pequeno armazém abandonado do que efectivamente ao velho prédio do Bairro de Nossa Senhora de Fátima onde habitávamos os quatro: eu a minha irmã e duas amigas.

Os quatro lanços de escadas que se seguiam, de tão estreitos, obrigavam a uma performance de contorcionismo na qual a noserider de listas azuis entrava como a assistente inexperiente de medidas generosas embatendo em tudo o que existia no palco à sua volta. A memória do último caminhar para o bico da prancha combinado com a linha de baixo do dub da viagem marcavam o compasso e chegava à porta do nosso andar já com o porta-chaves nos dentes com a sensação de quem, já na areia, acaba com sucesso uma onda na qual todas as secções ameaçaram fechar.
As meninas em casa desdenhavam do pranchão fazendo comparações (como só as mulheres sabem fazer) entre esta e a funboard verde alface que havia ocupado o seu lugar no meu quarto junto ao armário, e o seu respectivo espaço no meu coração.

“Era mais bonita” – diziam.
“Cagavas menos esta porra toda.” - creio que pensassem.

A casa, foi a mais velha onde vivi e a que certamente me trará melhores recordações. Nesse tempo havia música na minha vida. E isto não é uma metáfora. Havia mesmo.
O caminho da faculdade, que era na maioria das vezes o caminho da surfada, era preenchido com melodias vindas da Jamaica que apelavam à paz entre os homens e à cannabis entre as mortalhas. Cheguei a sentir que o meu renault clio vermelho-comido-do-sol às vezes tentava descolar, e que era mais fruto da leveza do condutor do que da vertiginosa velocidade de sessenta quilómetros horários a que era normalmente submetido. Havia música de manhã no meu quarto, caiado de branco com uns cortinados do-it-myself, quando estes falhavam a sua missão de travar os primeiros raios de luz e à noite se alguma jovem mulher cometia a decisão acertada de nos meus lençóis se deitar.

A música tem vindo a desaparecer da minha vida e creio que do meu surf. O carro é o mesmo, apenas a pintura vai perdendo as batalhas diárias com o Astro-Rei, mas, esventraram-no do seu cantante há quase dois anos num dia em que dormiu no Bairro Alto. Há-de ter sido trocado por dois caldos que silenciaram a agonia de alguém. Eu, por casmurrice, nunca mais o substitui e só lá está o buraco.

Estas palavras são de saudade. O meu bottom-turn está menos fora de tempo mas perdeu a melodia improvisada de uma bossa de aprendiz. Agora no elevador vou estático e troco muitas vezes a memória da última onda de fim de tarde pela preocupação com o primeiro telefonema da manhã seguinte. Mas quando olho no espelho esforço-me para me convencer que o que vejo são costas capazes de se contorcer caso surja a ocasião.

É que a vida que se leva, como a cidade, tem outro encanto na hora da despedida. E por muito que em certas alturas a queiramos com a graça do improviso, e que noutras busquemos a genialidade confortável da composição interpretada, sei de certo que o presente encerra muitas respostas na razão de um: – “Tem dias.”
Surfas bem? Estás contente? Gostas disto? És feliz?

Texto publicado na Free Surf Magazine

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Abre los Ojos

Fotografia de Priscila Tessarini, Caleidoscópio


Gostava de ter chegado um dia, inocente mas já consciente, e deitar-lhe um primeiro vislumbre. Não importava que tivesse visto imagens ou lido descrições, tenho a certeza que iria olhar, pasmado, face à nudez que um corpo desejado veste pela primeira vez. Em vez disso, cresci com ele ali. Desde sempre, ao virar da esquina, dado como adquirido. Com a mesma facilidade com quer ia pedir rebuçados à Tasca do Tonecas, pegava na bicicleta e ia até à arriba, espreitá-lo.

A certa altura, sendo eu dado a maleitas crónicas nos olhos, disseram-me que haviam duas formas de descansar a vista: a perfeita escuridão e o horizonte marinho. Nunca foi nada de grave mas, com a elevada resistência à dor que o cromossoma Y confere, preparei-me para o pior e passei a ir à arriba mais vezes. Não importava se cinco minutos ou meia hora, de relance ou uma tarde inteira, embrenhava-me nele... Fui aprendendo a, revendo, ver de novo e a não ficar indiferente àquilo que é "normal", que se repetete dia após dia e tendemos a menorizar. Quando vinha diariamente da margem sul do Tejo para Lisboa, raramente deixava de contemplar o rio, o casario e o reflexo de luz muito particular que a cidade tem. Via muita gente com o olhar pousado no mesmo brilho mas, o da maior parte, estava perdido noutros pensamentos, inexpressivo. O surf, com as suas repetições, esperas e envolventes, apenas veio potenciar esta visão das coisas.

Hoje, já sem tempo para preencher tão livremente, uso mais vezes o breu para descansar. De tantas vezes a ter espreitado, consigo desenhar ao fundo aquela linha que, mesmo ténue como nos dias cinzentos, tanta cor dava aos meus dias. Quando o desejo aperta, mais perto da arriba, desenho também umas ondas, quebrando perfeitas, vestindo-se só para mim...


"Quando eu me encontrava preso
Na cela de uma cadeia
Foi que eu vi pela primeira vez
As tais fotografias
Em que apareces inteira
Porém lá não estavas nua
E sim coberta de nuvens[...]"
Caetano Veloso, Terra


((Publicado na FreeSurfMagazine nº12, Junho 2009))

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Kids



Fotografia por Filipa Achega

Uma imagem vale quantas palavras?
Galiza 2009


quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Shut up and Fish!









Fotografias pré-wax na Caparica.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

The Reader



"Se um livro é uma janela,
Uma porta de luz para o lar,
Não será a mais bela
A que tem vista para o mar?"
Luis Paulo Magalhães


Um dia destes, ao voltar de casa dos meus pais, fi-lo "à moda antiga".

Antecipando um certo prazer, daqueles que se estragaram por excesso, ao ponto dos abandonarmos para só mais tarde redescobrir, roubei um livro das prateleiras do meu antigo quarto e fui para a paragem do autocarro.

Talvez seja estranho falar nestes termos das leituras com que palmilhava todos os quilómetros feitos em transportes públicos. Livros, revistas, jornais... tudo me servia para atenuar o sentimento de revolta pelo que na altura classificava como tacanhez paterna por não me agraciarem com um automóvel, evitando mesmo que ipirangasse um "Vou-me embora de casa!" em vez do mais usual "Mãe, o que é o jantar?".

No entanto, além de mediadores das injustiças decorrentes da ancestral característica paterna de não entenderem as reais necessidades dos filhos adolescentes/jovens adultos, é certo que chegava quase sempre mais tarde, mas também quase sempre mais "rico". Uma dessas leituras era obviamente a Surf Portugal. Da capa à contra-capa, entre os textos que lia duas vezes ou os que saltava depois das primeiras linhas, fazia a viagem casa-faculdade.

Não sei se gostei dos textos do Gonçalo Cadilhe à primeira leitura, mas sei que a dada altura passaram a ser eles a principal razão por dar aqueles trinta quilómetros mensais sempre por bem empregues. Quando as suas crónicas da SP passaram a livro, comprei-o imediatamente, relendo prazenteiramente, mesmo adivinhando palavras ou frases inteiras. Se tivesse de nomear um, um e apenas um, responsável pela forma como vejo, sinto, faço ou escrevo o surf, acho que seria o autor dos textos do Pulsar das marés e dos Sete mares. É aqui que entra o Pedro Adão e Silva.

Acho que já o conhecia do Ondas antes de ele iniciar a sua participação na SP. Mas certo é que, para mais sendo eu próprio secreto aspirante a cronista viajante de uma revista de surf, quando li o primeiro texto da coluna O Sal na Terra devo ter pensado que talvez fosse melhor não me despedir imediatamente do meu trabalho. Numa altura em que o GC terá partido no encalce dos passos de Magalhães, os textos do PAS preencheram esse lado melancólico e poético do off-surf, com o saber e mestria que encontra no surf propriedades químicas semelhantes à do hidrogénio: está em tudo e em todo o lado.

O PAS lançou um livro homónimo dessa sua coluna, onde reúne as suas melhores crónicas. E, porque além do mais usou a caixa de email aqui do blog para nos enviar o convite/press releass do lançamento (que só alguns dias depois descobrimos nas catacumbas do google groups para o qual o mail direcciona - Mountain View, we have a problem...), achei que merecia uma recomendação directa aqui da malta. Quer para quem não conhece, quer para quem como eu possa querer adivinhar palavras e até frases inteiras, parece-me uma boa leitura para a vossa poltrona favorita.

O livro que trouxe de casa dos meus pais, reacendendo a chama, foi o No princípio estava o mar, do GC. O do PAS quase que merecia que largasse o conforto do carro em casa por uns dias. Mas como vou trabalhar uns tempos para o interior profundo e oprimido, longe do mar e da família, O Sal na Terra talvez venha a servir para ultrapassar distâncias num outro meio de tranporte: a imaginação...


Fotografia de Tariana Mara

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Olha... vou surfar!


O odor já paira no ar... estou nóvamente em countdown para as férias, mas das de cariz permanente. Vou surfar, ler, surfar e relaxar. Compensar algumas lacunas que fui deixando junto dos meus herdeiros ao longo deste último ano. Já referi que ía surfar...?

Ao meu redor as pessoas andam doidas. Más caras, stress profundo, gripes Z e descapitalização numa panóplia de contextos que ultrapassam os económicos.

Por me faltarem meia dúzia de dias aqui no trabalho, comecei a engrenar a pesada máquina em modo automático.
'É pá e agora...?' 'Vais fazer o quê pá...?' 'O país está caótico...!!! O que vai ser de ti pá...?'

Por norma, nestas fases cíclicas que se me atravessam no trilho, o mar calha sempre a estar bom. Sou relegado para surfadas de sonho, por norma com nenhum crowd, o offshore desperta e num alcance de 30min disfruto das mais épicas condições... daquelas que bastantes semeiam uma vida inteira para usufruir dela nos derradeiros momentos da sua existência - surfistica pelo menos.

O carro tem a revisão feita e o gasóleo desceu. Tenho um quiver simpático de duas manas giras e começo agora a estar nóvamente de pés quentes mesmo com água a 15ºC e sem botas.

Regressam as ilucidativas e circunstanciais conversas de estacionamento, o contacto com a natureza e o doce inalar matinal da marezia. É por certo, o único dia-a-dia repetitivo que conheço que no entanto não roça a monotonia.

Algumas propostas pairam no ar e terei que analisar sériamente algumas delas.

Se não te atendi o telefone, fica certo que nos salgados entretantos que se avizinham poderás contar sempre e sem grandes pressas com um alegre...
'Olha... fui surfar!'